sexta-feira, 27 de abril de 2012

OS PROBLEMAS DA ÁFRICA DE HOJE.


OS PROBLEMAS DA ÁFRICA DE HOJE.

No mundo em que vivemos, a importância, a força de um continente pode-se medir por vários critérios: população, tonelagem de aço, nível intelectual (embora a riqueza cultural não tenha cotação na Bolça).
Ao olharmos para carta do globo, vemos nas altas latitudes do hemisfério boreal um conjunto de países ricos: a leste, a URSS; ao centro, a Europa; a oeste, os Estados Unidos. São estes os três gigantes (os dois extremos, os supergigantes) que dominam as actividades mundiais. O Japão e a China popular formam no extremo Oriente um “bloco” à parte.
O continente africano é o terceiro maior continente (em termos de extensão territorial), apresenta uma extensão de 30.300 000 km2, 54 Estados e uma grande diversidade sócio-cultural. As suas riquezas naturais fazem com que alguns economistas a considerem um el dorado.
Será que o continente africano está realmente acorrentado e, condenado a miséria perpétua conforme consideram certos autores?
Até que ponto as riquezas naturais de África são uma maldição ao invés de uma bênção?

África: seu lugar actual no mundo.

Num rápido olhar, o continente africano oferece hoje alguns dados que constituem um dos primeiros e maiores paradoxos do seu estado (Keita, 2009:11). Quanto à sua superfície, África ocupa o terceiro lugar (30 milhões de km2), atrás da Ásia (44 180 000 km2), da América (42 milhões de km2), mas de longe à frente da Europa, que tem somente cerca de 10 milhões de km2 e da Oceânia (9 milhões de km2, aproximadamente).
É um continente subpovoado, mas que possui potencialidades consideráveis, apontadas e cobiçadas por todos.
A sua indústria representava há poucos anos apenas 0,9 por cento da produção industrial mundial, enquanto a sua parte é maior no que diz respeito ao fornecimento de numerosos recursos naturais, bem como de produtos agrícolas (pelo menos em termos de capacidades).
Assim proporcionaria: cerca de 66% da extracção mundial de diamantes; cerca de 58% do ouro do nosso planeta; 45% do cobalto; 23 do antimónio (participando no fabrico de caracteres tipográficos) e dos fosfatos; 17,5 % do cobre e do manganésio; 15% do cromo e do petróleo; 66% do cacau; 40% do óleo de palma; 28% do amendoim.
Eis a África na actualidade; as referidas proporções tinham, dois séculos atrás, um carácter ainda mais desmedido, pois o resto do mundo dependia, em muito, dela (idem).
O lado irónico ou caricatural de tudo isto é que os preços de todos esses produtos são decididos e definidos no exterior, nas grandes bolsas de valores da Europa e da América do Norte (Jalée, 197, p. 7). Esta situação tem uma influência certa na resolução do desafio que colocamos no início, ou seja, uma (re)interrogação objectiva da História, a fim de devolver à África a sua “plenitude cultural”, segundo uma expressão bem feliz de Cheik Anta Diop (Apud, Keita, op cit, p. 14).
A realidade, no campo da investigação em ciências sociais e humanas, não desmente esta verdade com orçamentos nacionais obrigados, por injunção das Organizações Internacionais de Financiamento por “as prioridades estarem  noutros sectores”, aqueles mesmo definidos por elas, na medida em que são fornecedores de mais-valias para o desenvolvimento dos seus países (europeus e americanos).

Porque a África é tão pobre?

A África, depois de haver ocupado o primeiro lugar no decurso da Pré-História, sofre um atraso qualitativo. Certas regiões encontram-se ainda na Idade da Pedra. Outras vegetam sob o regime colonial. Outras ainda se debatem nas águas por vezes turvas de uma independência hipotecada.
Com cerca de trezentos milhões de habitantes em três biliões e meio que existem no mundo, a África tem uma população total nitidamente inferior à da Europa.
Apesar do seu potencial natural, Guest (2004:7) considera que o nível de vida das populações africanas não se ajusta com os números anualmente apresentados pelas grandes Bolsas de valor sobre a produção dos recursos do continente “berço”.
Considera ainda que o baixo nível de instrução das populações africanas, a pobreza estrema em que as populações africanas se encontram mergulhadas, a má distribuição dos bens públicos, os governos vampiros, as altas taxas de mortalidade infantil e materna, o crescimento sem precedentes de pessoas portadoras do vírus HIV, a existência de zonas potencialmente ao contagio de várias doenças, a corrupção dos seus governantes e os golpes de Estado, tornam a África realmente um continente acorrentado.
Procuramos apresentar este resumo devido a necessidade de conhecimento sobre os vários problemas que enfermam a nossa África. Como pode um continente potencialmente tão rico, apresentar os piores males na face da terra?
Até quando o tráfico de escravos, a escravatura e o colonialismo será apresentada como desculpa para os males da nossa África?
Segundo Robert Guest (idem), a África está num mau caminho e, o seu livro, é a tentativa dele de explicar porquê. Este livro é sobre as razões do porque a África é pobre, por isso, tem de tratar da guerra, da peste e de presidentes que pensam que o seu cargo é literalmente uma licença para imprimir dinheiro.
Neste trabalho apresentamos um único capítulo, onde todos os subtemas girarão entorno da temática porque a África é tão pobre.
A África sofreu e continua sofrer com uma dose de maus líderes. Os mais tiranos, como Ide Amin e Mobuto Sese Seko, são bem conhecidos. O que é menos conhecido é que os seus líderes bem intencionados também lhe causaram graves danos. Julius Nyerere, o venerado primeiro presidente da Tanzânia, esperava sinceramente fazer o seu povo mais feliz e próspero, forçando milhões de tanzanianos a trabalhar em herdades colectivas gigantes, mas em vez disso quase destruiu a capacidade do seu povo para se alimentar (Guest, 2003:6).
Qualquer país habitado por seres humanos tem potencial para enriquecer. Em termos históricos, a maldição da África não é exclusiva. A forma como os africanos vivem hoje não é muito diferente daquela como os europeus viviam antes da Revolução Industrial. De facto, os africanos modernos vivem mais anos do que os europeus e americanos viviam antes do século XX, em grande parte porque muitos medicamentos úteis que foram inventados noutro lado — os antibióticos, por exemplo — tornaram-se suficientemente baratos para os africanos os comprarem (idem, p. 8).
Não dá grande conforto aos africanos, na verdade, ouvir contar que há cem anos outras pessoas igualmente pobres.
Alguns africanos culpam a Geografia. É sem duvida um factor. Os vitorianos acreditavam que o calor retira energias e esgota a força de um homem. Um laço mais correcto entre clima e pobreza é o de que os países quentes são palco de toda uma série de doenças que afectam tanto as pessoas como gado. A África tem as piores: malária, febre-amarela, raro e mortífero vírus como o Ébola, e uma legião de parasitas que sugam as energias.
Beba-se um copo de água na Nigéria, por exemplo, e poder-se-á ficar infestado de lombrigas e vermes-da-Guiné. Mas os africanos não podem fazer grande coisa acerca do clima que permite evolução destes horrores e é eficiente quando se está a braços com parasitas ou a tremer de febre.
Outro culpado popular para os males de África é a História. Muitos africanos defendem que os actuais problemas do continente decorrem em grande parte dos traumas a que os europeus sujeitaram a África, a escravatura acima de todas.
É um argumento emocional. Nos séculos XVII e XIX, milhões de africanos foram raptados, acorrentados, postos nos porões fétidos dos navios de escravos e transportados para o outro lado do Atlântico. Muitos morreram antes de chegarem ao destino.
Os colonialistas deixaram cicatrizes profundas. Mas também deixaram para trás coisas úteis como estradas, hospitais e leis.
Se o colonialismo era o que atrasava África, esperar-se-ia que, quando ele acabou se verificasse uma explosão de crescimento. Não foi o caso (ibidem, p. 9).
Talvez o problema seja que o legado do colonialismo continua presente, mesmo depois de os colonos terem partido. Até certo ponto isto é uma verdade.
Segundo Joseph Ki-Zerbo (1999:365), certos Estados dão à África, com uma mão muito caridosa, aquilo que com a outra lhe retiram, espoliando-a de maneira nada caritativa. As fronteiras de África ainda são fonte de problemas. Isto causa frequentes tensões e por vezes faz correr muito sangue.
Mas os países africanos decidiram por si mesmos não corrigir as fronteiras coloniais, com medo de que isso originasse novos conflitos, em lugar de acabar com os antigos.
Alguns africanos defendem que o seu continente foi traumatizado pelo que Steve Biko, um revolucionário sul-africano chamou de “a colonização do espírito”. Os governantes brancos julgavam inferiores os seus subordinados negros.
Mesmo hoje, ainda há quem defenda que a falta de confiança dos africanos os impede de desenvolver todos os seus potenciais. Pode ser assim uma certa medida, mais de 70% dos africanos de hoje nasceram já depois da independência. E os exemplos de outros países sugerem que as desagradáveis experiências coloniais não condenam necessariamente um país à penúria eterna (ibidem, p. 12).
A Coreia, por exemplo, foi anexada pelo Japão em 1910 e libertada apenas quando a América lançou bombas atómicas sobre Hiroshima e Nagazaque. Enquanto governaram a Coreia, os colonialistas japoneses tentaram destruir a cultura local e submeter a população à servidão.
A língua coreana foi banida, os coreanos impedidos de aceder à universidade e profanados sistematicamente os mais sagrados locais de culto coreanos nas montanhas. Enviaram jovens coreanos para o Japão para trabalhos forçados nas minas e fábricas de munições, ou obrigaram-no a servir no exército imperial. Arrebanharam mais de cem mulheres coreanas, algumas com apenas doze anos de idade, para servirem de escravas sexuais nos bordéis militares. E as provações terminaram com a libertação. Pouco depois de os colonialistas japoneses partirem, a Coreia mergulhou numa guerra civil que custou um milhão de vidas e dividiu o país ao meio.
Com uma história tão traumática, a Coreia teria todas as desculpas para falhar ao nível do desenvolvimento. Mas a parte sul, capitalista, que era tão pobre como o Gana em 1953, é hoje vinte vezes mais rica.
 A formosa, Hong Kong, a Malásia e Singapura — tudo ex-colónias — são todas ricas e pacíficas. Como o são a Irlanda, a Austrália e Massachustts. O legado colonial de África, embora influente, não pode explicar tudo o que está mal hoje em dia (ibidem, p. 13).
Outro problema que tem de culpar a herança do colonialismo pelos males actuais de África é que nos dá poucas pistas para resolver esses mesmos males. A História, como a Geografia, não pode ser mudada. Queixamo-nos dos erros do passado, é natural e humano, mas também pode fornecer uma desculpa para o desespero.
Se os problemas de hoje são da responsabilidade do Ocidente, a solução óbvia é exigir ao Ocidente que os resolva.
Desde a independência que os governos africanos têm falhado ao que prometeram ao povo. Poucos dão ao cidadão comum a liberdade de cavar a sua fortuna sem embaraços oficiais. Poucos defendem a lei, dão valor a contratos ou salvaguardam os direitos de propriedade. Muitos são descaradamente predatórios, servindo de meio a uma pequena elite para extrair dinheiro de todos os outros cidadãos.
Os governos de rapina tornam geralmente os seus países mais pobres, como acontece na Nigéria e na República Centro Africana. Pior: quando o poder confere riquezas, as pessoas por vezes lutam por ele, como no Congo e na Libéria.
O poder não vigiado é uma estrada aberta para os ricos, especialmente em países com abundantes recursos naturais. A África tem recursos fabulosos em minerais preciosos, o que é uma razão para tanta gente estar pronta a lutar por uma fatia de poder. A riqueza mineral de África deixa de ser uma maldição para ser uma bênção.
Outro obstáculo à prosperidade de África é a Sida. Apesar de todos os avanços da medicina moderna, a esperança de vida caiu em grande parte de África nas últimas duas décadas;
A pobreza acelera a epidemia. Quem não tem dinheiro para comprar uma televisão, passa o serão a fazer outras coisas. Muitos africanos não tem dinheiro para comprar antibióticos e portanto não podem tratar doenças sexualmente transmitidas, o que abre feridas para o HIV entrar.

Os africanos ainda não são livres.

 Os africanos são pobres em grande parte porque ainda não são livres. Vivem sob o jugo de governos predatórios e incompetentes, que têm enorme dificuldade em afastar (ibidem, p. 40)
Os seus governos empobrecem-nos de muitas formas; pela corrupção, com políticas económicas desastrosas e por vezes, como no caso do Zimbabwé, criando uma atmosfera de terror que atemoriza o mais intrépido homem de negócios e investidor potencial.
Em teoria, a maioria dos africanos são livres de destituir os seus governantes, mas na prática as dificuldades são enormes.
Em nenhuma outra parte do mundo os governantes demonstraram tanta habilidade para manipular uma eleição como em África. O regime de Mugabe tornou-se parecido com uma ténia nos intestinos do Zimbawé, alimentando-se com os frutos do trabalho dos outros, roubando as forças à nação.
Ao contrário das ténias, porém, Mugabe e os seus apaniguados mostram-se bem mais difíceis de exterminar que os parasitas intestinais.
Nas eleições de Julho de 2000, viu-se em primeira-mão até onde eles estão dispostos a ir para se manterem no poder (idem, p. 53). Era uma eleição legislativa e não presidencial, pelo que o lugar de Mugabe não estava em causa. Mas o velho senhor estava, mesmo assim preocupado. O MDC só estava activo há poucos meses mas parecia disposto retirar a maioria parlamentar à ZANU. Mugabe respondeu oferecendo terras gratuitas aos seus apoiantes e raios de bicicleta afiados aos seus adversários.


Quais os medicamentos que podemos administrar neste “paciente”.
Na perspectiva de Ki-Zerbo (1999:367), três remédios podiam ajudar a relançar a África neste triplo campo: a produtividade, o esforço de autonomia e a unidade.
A produtividade é a chave do progresso. A África em relação ao pelotão da frente (as superpotências mundiais) conserva uma velocidade constante, se é que, tendo em conta o desenvolvimento demográfico, a sua progressão não está uniformemente retardada.
O segundo meio é a formação dos homens. Este ponto é importante e de tal maneira evidente que se torna desnecessário insistir nele. Depois será necessário pormos todos ao trabalho (ibidem, p. 368). É imperioso encorajar o espírito de empreendimento e de criação a longo prazo.
Os asiáticos, talvez sob pressão do número, compreenderam o sentido do esforço constante. Dois países, Japão e a China, com duas ideologias diferentes, conhecem um progresso prodigioso. A África, por falta de capital financeiro, deveria pois utilizar ao máximo o capital-trabalho. Só o assentamento de novas estruturas e a criação de pólos autóctones de desenvolvimento permitirão encontrar uma saída.
A terceira saída para a resolução dos problemas da África é a unidade, porque só assim os africanos poderão promover a economia da África.
A África nova, esta África que se apresentará cada vez mais “sem fronteiras”, deve escolher entre ser um objecto da história e uma força actuante a escrever a sua própria história. E, se me pedissem que indicasse, por ordem de prioridade, os elementos que dependem dos próprios africanos, os dois factores-chave desta promoção eu designaria a formação dos homens e a unidade (Ki-Zerbo, idem, p. 371).
E, se insistissem em que eu escolhesse ainda entre os dois o factor decisivo, faria minhas de bom grado as palavras do sábio antigo: «Dêem-me uma alavanca e levantarei o mundo.» Eu traduziria: «Construamos a unidade e faremos arrancar a África».


Referências bibliográficas

GUEST, Robert. África, Continente Acorrentado. O passado, o presente e o futuro da África, civilização editora, (s/l), 2004.
JALÉE, Pierre. A Pilhagem do Terceiro Mundo, Sá da Costa Editora, Lisboa, 1973.
KEITA, Boubakar N., História da África Negra, 1ª edição, Texto Editores, Luanda, 2009
KI-ZERBO, Joseph. História da África Negra, IIº volume, 3ª edição, Publicações Europa-América, 1999.


Por Domingos Segredo Manuel. Lincenciando em História pela UAN/ISCED

O TERRITÓRIO E AS POPULAÇÕES MAIS ANTIGAS.

O TERRITÓRIO Angolano E AS POPULAÇÕES MAIS ANTIGAS.

PLANO DE ESTUDO:  2.1. VESTÍGIOS ARQUEOLÓGICOS DO PALEOLÍTICO E NEOLÍTICO.
2.2. AS PRIMEIRAS COMUNIDADES HUMANAS DO TERRITÓRIO: OS KHOISAN E OUTROS.
2.3. O PROCESSO DE SEDENTARIZAÇÃO – ECONOMIA AGRÍCOLA.
2.4. AS MIGRAÇÕES BANTU.

2.1. Vestígios arqueológicos do paleolítico e neolítico.

No que se refere a actual território angolano, particularmente, em termos de pesquisas arqueológicas, somente no final dos anos 40 e princípio da década de 50, século XX, se iniciou com prospecções sistemáticas e consequentemente escavações. Os resultados obtidos foram directamente aproveitados para um começo de levantamento de um mapa arqueológico de Angola, para o conhecimento de sua pré-história. Mas, estes esforços não foram igualmente repartidos em todo território angolano.
De facto, de todo país, a zona mais conhecida no aspecto da pré-história é a zona das Lundas. Isto devido ao apoio concedido pela companhia de Diamantes de Angola – Diamang, que desde 1946 iniciou com publicações culturais. Um dos primeiros trabalhos a ser publicado foi sobre arqueologia pré-histórica, da autoria de Jean Janmart, que era nessa altura, chefe de serviço de protecções da companhia.
Sob o ponto de vista de ecologia pré-histórica, de acordo com Desmond Clark, o território angolano recorta-se em regiões ou zonas bem distintas entre si, subdivididas da seguinte forma:    - A região do Congo, a do Zambeze e a do Sudoeste. Assim é, ainda segundo este autor, porque nessas regiões se teria originado, a partir do início do Plistócenio superior, condições culturais diferentes. 

a) Zona do Congo
Vasculhando as cascalheiras depositadas pelos rios, nota-se a existência de alguns utensílios feitos de seixos rolados, que podem assinalar as mais antigas indústrias humanas da zona. Apesar de, no entanto, a sua posição de estratificação[1] não permanecer segura. Em contrapartida as cascalheiras de terraço de 10 metros deram instrumentos atribuíveis a uma fase evoluída do Olduvaeinse e ao Acheulense inferior. E, as superfícies das mesmas, em certos locais, recolheram-se artefactos de Acheulense superior. A leitura, nesta zona, da estratigrafia permite seguir a evolução das indústrias florestais derivadas do acheulense. As outras características da zona são: Neolo – Lupembo – Tshitolense.

A cultura Sangoense
Entre mais ou menos 46 mil a mais ou menos 37 mil anos, foi muito difundida na África central, tendo a bacia do Congo como foco de erradicação. Os instrumentos típicos desta cultura foram os “Picos”. O equipamento Sangoense parece ter sido idealizado para trabalhar a madeira ou cortar árvores e, segundo Desmond Clark, também para abrir caminhos através da floresta.

A Cultura Lupembense
Esta cultura decorreu entre mais ou menos 36 mil anos `a mais ou menos 14 mil anos. Foi presente durante a idade média da pedra, nas regiões florestais do Congo, Angola e parte da Zâmbia, como também em África oriental. O utensílio típico desta cultura, a sua peça mais bem acabada, é a ponta bifacial, lanceolada, que tanto servia de faca do mato, como de lança de arremesso.

A Cultura Lupembo – Tshitolense
De mais ou menos quinze mil anos à mais ou menos nove mil anos, segundo alguns autores, é a cultura correspondente das zonas de florestas, e prossegue a tradição Lupembense na bacia do Congo.

A Cultura Tshitolense
Esta cultura durou, em certas áreas, de mais ou menos treze mil anos ate quatro mil e quinhentos anos, antecedendo, assim, o Neolítico. Em outras áreas supõe-se que durou até a idade de ferro, por volta de mais ou menos dois mil anos, ou até mesmo um pouco depois. A cultura Tshitolense desenvolveu-se na zona meridional e na ocidental da bacia do Congo, onde os povos caçadores da época habitavam as chanas dos planaltos cobertos pelas areias do Calahari, com galerias florestais ao longo dos rios.


b) A zona do Zambeze
Para esta zona, sabe-se ainda muito pouco, não sendo possível por agora traçar a sua evolução em termos estratigráficos e culturais. Contudo, a zona assim denominada corresponde a parte leste e sudeste do actual território angolano. Ela abarca um pequeno troço inicial do rio Zambeze e parte do curso de alguns dos seus afluentes.

c) A zona Sudoeste
É a região que abarca o sudoeste do território angolano, com a faixa costeira entre a escarpa litoral e o mar. A zona sudoeste encontra-se interiormente delimitada, a norte e a leste, por uma linha curva que, da barra do rio do Kwanza, passa por Huambo e Menongue, aproximadamente. Trata-se de uma região sobre a qual alguns autores escreveram – Geomorfologistas, Geógrafos, etc… - mas para a qual não se tem ainda um estudo exaustivo, consagrado ao quaternário (isto é, o período geológico actual), e que permita traçar uma evolução cultural do conjunto, apoiada em dados estratigráficos seguros, como na zona das Lunda.

2.2. As primeiras comunidades humanas do território: os khoisan e outros.

Os bochimen ou bushmen dos grupo Khoisan, os vátuas e os pigmeus são os primitivos representantes dos habitantes da África Central e Austral.

2.2.1. Os vátuas de Angola.

Os vátuas vivem hoje no deserto do Namibe, junto à costa, levam uma vida muito primitiva, dedicam-se a caça de antilopes e zebras. São estimadamente 6000 habitantes. Tal como salienta o padre Carlos Estermann, é impossível saber qual a origem deste povo. As hipóteses postas são  inúmeras, algumas até bem fundamentadas, mas todas discutíveis.
A tradição oral admite que os vátuas ocupavam, antigamente, a terra vasta e boa à beira do deserto, a qual tiveram de compartilhar em dada altura com um invasor (os Helelos, nomeadamente os Kuvale). Atormentados pelos invasores (ambiciosos e melhor preparado para a luta), os vátuas foram obrigados a refugiarem-se na parte mais árida da terra conquistada. Passaram aí anos maus de sede e fome, até que decidiram por-se ao serviço do invasor. Alguns conseguiram libertar-se mais tarde e regressar à vida primitiva.
Os vátuas são também colectores. Os homens buscam o mel e caçam (aves, pequenos antílopes e mesmo holongos); as mulheres dedicavam-se a cozinha e colhiam tuberculos, legumes e frutos espontâneos.
Por serem nómadas, vagueiam espalhados ao longo da faixa que se estende entre o mar e os contra fortes da chela, do rio cunene (a sul) a té quase à linha férrea do C.F.B. (à norte).
Os Kuepe, conta a tradição que eles vieram de longe, de uma terra rica de gado, talvez a dos Hotentote que ficava onde o sol nasce. Partiram daí um dia, seguiram o vale do Koroca no qual se fixaram e cruzaram com os Kuissi. Os sucessivos descendentes destes dois grupos constituiram depois um povo negro não bantu. Os Kuepe são pastores, caçadores e em tempos posteriores passaram a fazer pequenas hortas onde cultivam a batata doce, o milho, a melancia, etc.

2.2.2. Os Khoisan.

os não negros e não bantu compreendem os bochimanen e Hotentotes, designados em conjunto por grupo Khoisan. Em 1652, quando Jean Van Riebeeck estabelecia no Cabo o entreposto para reabastecer os navios enviados para a Índia Oriental, os colonos holandeses encontraram gente que viviam do pastoreio de vacas e carneiros, da qual já havia chegado notícias dos cronistas portugueses e e boers que os chamou de Hotentotes.
Exploradores e missionários como Sparman (1784), Thunberg (1794), Lichtenstien (1812), Campbell (1815), Burchell (1822) e Arbousset (1842), encontraram mais tarde uma gente parecida, mais pequena, que habitava em terras altas e alimentavam-se de caça, mel e bolbos de plantas selvagens. A esta gente deram o nome de Bosjesmannem (homem do mato em holandês). Parecidos, de facto, e por vezes confundidos, os Hotentotes e bochimen distinguem-s por serem pastores e colectores respectivamente. A sua chegada à África, se é que vieram de outro continente, não foi até hoje esclarecida.
Ao contrário dos bantu, os khoisan sãomonógamos. Não possuem qualquer organização política. A sua língua é caracterizada por numerosos estalidos palatais. Têm uma grande intuição para se orientar nas matas e no deserto. São de pequena estatura, sendo a média de altura para homens 160m e para mulheres 150m.
Não se tem dados precisos sobre sua origem, aventando-se hipóteses de que sejam originários da Mongólia ou ainda que sejam um cruzamento de homens asiáticos com mulheres de África Oriental.
Não cultivam a terra nem criam gados. Vivem do produto da caça e da colheita de frutos silvestres e tubérculos, não têm qualquer espécie de habitação, dormem em cavernas ou por trás de tufos vegetais [apenas recentemente começaram a construir palhoças]. A maior parte foram escravos das tribos vizinhas ás quais eram obrigados a entregar as peles provenientes das caças. Alguns preferem viver solitários sem lugar fixo. Os khoisan têm uma grande capacidade de aguentar a fome durante muitos dias sem que isso os encomode muito.
Hoje são calculados em 40.000 habitantes em toda a África Meridional. Em Angola não excedem a 7000 dispersos em pequenos grupos nas províncias do Kuando-Kubango, Huíla e Kunene.  
2.3. O processo de sedentarização – economia agrícola.

Neste período deram-se transformações muito importantes. A maior parte dos instrumentos deixou de ser de pedra lascada e passou a ser de pedra polida. Esfregando as pedras sobre areia no chão ou sobre outras pedras mais duras que serviam de polidores, os homens foram obtendo utensílios cada vez mais perfeitos e variados. Por isso se chama ao Neolítico, idade da pedra polida ou idade da pedra nova.[2]
Pouco a pouco, também o clima se foi alterando. O homem deixou de ser nómada e tornou-se sedentário, isto é, passou a viver em lugares certos e a construir habitações.
Aprendeu a cultivar a terra, a tecer a , o cânhamo e o linho, a domesticar o cão, o porco, o carneiro, a cabra, o boi. Surgiram os primeiros rebanhos e deixou de haver procura de tanta caça.
A compreensão do processo que levou ao progressivo domínio do homem sobre os seus recursos alimentares afasta a hipótese de agricultura ter sido “inventada” por um certo e determinado povo em particular.
Foi no Sudoeste da Ásia que o cultivo dos cereais e o pastoreio foram primeiramente praticadas, no decurso do VIII milénio: o trigo e a cevada foram os primeiros cereais a serem cultivados nas regiões de grandes planícies de aluviões férteis (do Egipto e da Mesopotâmia) de clima temperado e húmido.
A partir dessa zona, designada por “Crescente Fértil”, o conhecimento da agricultura difundiu-se pelos três continentes: África, Ásia, Europa.
A agricultura permitiu a formação de comunidades mais estáveis e seguras: grupos mais numerosos podiam fixar-se por mais tempo numa dada área. Com a caça e recolecção só podiam alimentar-se aproximadamente 10 pessoas por quilómetro quadrado; com a produção agrícola, na mesma área, podiam abastecer-se cerca de 400 pessoas.
Os trabalhos da terra (preparação da terra, sementeira), a demora na germinação e amadurecimento dos grãos, a colheita e o armazenamento obrigavam à permanência dos homens junto das terras cultivadas.
Muitas comunidades situadas em regiões menos favoráveis para a agricultura fizeram da criação de gado a sua actividade fundamental.
Novas técnicas começaram a ser praticadas ao mesmo tempo que se desenvolvia a agricultura e a pastorícia. A melhoria nos instrumentos s de trabalho[3] e a adopção de novas técnicas reflectiu-se no aumento da produtividade.
O excedente que sobrava podia ser trocado. Com a especialização das comunidades neolíticas em agrícolas e pastoris, aumentou a capacidade de produção e de troca do excedente.[4]
Assim, tribos dedicadas a actividades produtivas diferentes trocavam a lã, o leite, a carne e os couros por cereais e outros produtos agrícolas.
As primeiras aldeias de camponeses formaram-se no Próximo Oriente, no Nordeste de África (vale do Nilo), nos vales dos rios Tigre e Eufrates, e na Índia onde a terra era fácil de trabalhar e mesmo com as técnicas rudimentares se podia obter um pequeno excedente de alimentos.
A existência de um excedente permitiu que os chefes, cujo poder se baseava no prestígio e no respeito que a comunidade lhes prestava, deixassem de trabalhar directamente na produção. Aparecem assim chefes — sacerdotes, chefes de guerra, adivinhos e “fazedores de chuva”. A eles eram atribuídas grandes qualidades: coragem, sabedoria, poderes mágicos.
À medida que aumentava o poder dos chefes ia diminuindo a igualdade entre os membros da comunidade: assim se caminhava no sentido do desaparecimento do igualitarismo da comunidade primitiva, da instalação e agravamento de uma desigualdade social que iria dar origem à sociedade de classes.

2.4. Os bantu.
(A ÁFRICA BANTU)

Antes de abordar a questão das migrações urge a necessidade de aflorar a origem deste grupo etnico.
Bantu, esta designação fundamenta-se na língua destes povos, em que o radical “ntu” qualifica as pessoas humanas. O prefixo do qual “ba” forma a palavra bantu que significa etimologicamente pessoa ou gente. O singular é “muto ou munto”.
Foi Bleek, filosofo alemão e tratadista das línguas africanas que no século XIX deu ao conjunto de línguas e dialectos faladosna África meridional, o nome de bantu depois de ter demonstrado a analogia das suas estruturas.
Os bantu constituidos em mais de duzentos milhões de pessoas ocuparam o território da África Central, Meridional e sul do equador, que vai desde os Camarões ao rio Juba, na Somália e a sul até África do Sul.
Neste mesmo espaço territorial existem outros pequenos grupos de povos negros não bantu: os vátuas de Angola, os pigmeus da floresta equatorial africana e os não negros não bantu – os hotentotes e os boshimen ou bosquimanos.
Em Angola existe maioritariamente população bantu estimada em 14.000.000 de habitantes.

2.4.1. As migrações bantu.

Tem havido muitas discussões sobre a origem dos bantu. Certas versões tradicionais e alguns investigadores dos últimos tempos defendem teorias diferentes, sem contudo se chegar a uma conclusão.
Uns defendem que os bantu têm a sua origem na região dos Grandes Lagos, na África Central, outros indicam a Ásia, local onde em tempos remotos, este povo partiu para se fixar na região dos Grandes Lagos ou no Sudão, tendo posteriormente emigrado para sul.
Outros ainda indicam que os bantu  teriam entrado na África pelo Istmo do Suez ou provalvelvemente através do mar Vermelho, indo fixar-se na Abissínia há uns cinco milénios, donde há uns 2500 ou 2000 anos teriam partido para sul e sudoeste, espontâneamente ou sobre pressão de outros povos.
De acordo com Luís Figueira, os bantu derivam uma migração iniciada há alguns milhares de anos antes de Cristo em certo lugar da África Central.
Os seus primeiros antepassados partem talvez dos actuais Camarões para a Ásia, onde se cruzam com os mongóis, os drávidas e os árias. Os descendentes desse cruzamento voltam depois ao continente de origem através do estreito de Beb el Mandab e pelo Suez. Vêm sem carácteres definitivamente estabilizados, em vagas periódicas.
Provalvelmente, receosos do Egipto faraónico, ou seja,  da escravatura, sobem o rio Nilo e espalham-se na faixa lacustre da região dos Grandes Lagos. Encontraram aí um clima favorável, a segurança procurada e bons meios de vida, criaram então a própria língua, prosperaram e multiplicaram-se abundantemente.
Escaceados os recursos naturais pela densidade demográfica que aumentava, uns demandaram-se para a margem do oceano Índico, Até que se encontraram de novo com a Ásia. Penetraram pelo Lago Niassa, seguiram o curso do rio Zambeze, invadiram os territórios circunvizinhos, avançaram para sul e retrocederam mais tarde para Norte. Este ramo tem o nome de Cafre ou Cafir, que significa infiel em árabe.
Outros metem-se à aventura de atravessar a Floresta Equatorial, seguiram o curso do rio Congo e difundiram-se pelas duas margem do Lago Chad às nascentes dos rios Cassai e Lulua. Este  grupo constituem o ramo Bacongo.
Segundo vários critérios, certos autores dividem estes dois ramos de bantu em vários grupos, sendo de reter para simplificar os seguintes: bantu ocidental, bantu oriental e bantu meridional.
Não se sabe exactamente quando os Cafre e os bakongo entram em Angola, probabilidades evocam ter sido na idade do ferro final. Com o decorrer dos séculos as vicissitudes passadas e as acomodações necessárias formaram dois mudus vivendi diferentes:
·   Os bantu do ramo Cafre dedicam-se à pecuária, constroem casas circulares com tecto cónico, vestem-se de peles de animais, festejam a puberdade, utilizam a zagaia ou a lança como armas para a defesa e caça. Fazem parte deste ramo os seguintes grupos etnolinguísticos: Helelo, Nhaneca-Humbe, Ambó e Xindonga.
·   Os bantu do ramo Bakongo cultivam a terra, constroem casas rectangulares de duas águas, usam o arco, formam associações secretas, vestem-se de fibras de casca de árvore e dão-se às danças de máscaras. Pertence á este ramo o grupo etnolinguísticos Kikongo.

  
                 (A EXPANSÃO  BANTU)                                  (RAMOS BAKONGO E KAFRE DE ANGOLA)

Do contacto entre estes dois ramos, kafre e Bakongo, provêm os seguintes grupos etnolinguísticos: Kimbundo ou Mbundo, Lunda-kioco, Ganguela (predominantemente Bakongo) e Umbundo (predominantemente kafre).
Os bantu de Angola pertencem na quase totalidade ao grupo ocidental, que se espalhou pela África Ocidental desde os Camarões até ao sul de Angola, havendo pequenas infiltrações do grupo meridional no sul do país.
Toda movimentação bantu decorreu ao longo de muitos séculos, acabando dando corpo ás diferentes etnias que se distribuem pelo território, compondo um quadro específico de valores que definem cada grupo etnolinguístico. No geral também se recohecem alguns elementos comuns entre vários grupos, detectáveis não só na língua que lhes é comum como de algum modo na própria estrutura sócio-política, isto é, cada formação étnica é sempre o produto final da integração, absorção das especificidades culturais em cena, ao longo de todo o percurso até a consolidação das sociedades respectivas.
por Domingos Segredo Manuel.

[1] Estratigrafia: parte da Geologia que estuda as rochas estratificadas.

[2] ESPINOSA, Fernando e GUERRA, Maria Luísa. História – Antiguidade Oriental, Grécia e Roma, Porto Editora, (s/d), p. 16
[3] Esses meios tiveram uma importância fundamental na evolução das sociedades humanas e permitiram o aumento dos agrupamentos, a sua sedentarização e a divisão social do trabalho. É daí que aparece o termo “Revolução Neolítica”, devido à generalização de uma nova técnica de fabrico de instrumentos de pedra. Estas transformações ocorreram em todos os continentes ao mesmo tempo, pelo contrário, ocorreram primeiro em certas regiões.
[4]É necessário termos em conta que, o acumulo de excedentes e a divisão social do trabalho deram origem a um desenvolvimento diferente e desigual entre os homens.