ÁFRICA NEGRA
Nação civilizada e berço da Humanidade
Parte III
Por
que é a raça uma questão tão grande?
BEM desde o começo da
história registrada, o conceito de “eles” e “nós” tem dominado o modo de pensar
das pessoas. Muitos convenceram a si mesmos de que são as únicas pessoas
normais que em tudo têm as maneiras corretas de fazer as coisas. Isto é o que
os cientistas chamam de etnocentrismo, o conceito de que o nosso próprio povo e
maneiras sejam os únicos que contam.
Os antigos gregos, por
exemplo, não tinham um conceito favorável sobre os “bárbaros”, um termo que
aplicavam a quem quer que não fosse grego. A palavra “bárbaro” se originou de
como as línguas estrangeiras soavam aos ouvidos gregos, com muitos
ininteligíveis “bar-bar”. Os egípcios antes deles e depois os romanos também se
sentiam superiores a outros povos.
Por séculos os chineses
chamavam seu país de Zhong Guo, ou o Reino do Meio, porque
estavam convencidos de que a China era o centro do mundo, se não do Universo.
Mais tarde, quando missionários europeus de cabelo ruivo, olhos verdes e pele
corada chegaram à China, os chineses os tacharam de “diabos estrangeiros”.
Similarmente, quando os orientais pela primeira vez chegaram à Europa e à
América do Norte, seus olhos oblíquos e o que eram considerados costumes
estranhos fizeram deles alvos fáceis de zombaria e suspeita.
Todavia, há um fato
significativo a considerar, como diz o livro The Kinds of Mankind:
“Crer na sua superioridade [racial] é uma coisa; tentar provar isto, usando as
descobertas da ciência, é algo diferente.” Empenhos de provar que certa raça é
superior a outra são relativamente novos. O antropólogo Ashley Montagu escreveu
que “o conceito de que existem raças da humanidade naturais ou biológicas
que diferem umas das outras mental e fisicamente é um conceito que não havia se
desenvolvido até a parte final do século dezoito.”
Por que a questão da
superioridade racial se tornou tão preeminente nos séculos 18 e 19?
Comércio de escravos e raça
Uma das principais razões
é que o lucrativo comércio de escravos havia atingido o seu ápice, e centenas
de milhares de africanos estavam sendo levados à força e pressionados à
escravidão na Europa e nas Américas. Não raro as famílias eram dissolvidas, com
homens, mulheres e crianças sendo enviados a diferentes partes do mundo, jamais
se tornando a ver. Como podiam os mercadores e os donos de escravos, a maioria
dos quais afirmava ser cristãos, defender tais atos desumanos?
Por propagarem o conceito
de que os negros africanos eram por natureza inferiores. “Estou inclinado a
suspeitar que todos os negros, e em geral todas as outras espécies de homens,
sejam por natureza inferiores aos brancos”, escreveu o filósofo escocês do
século 18, David Hume. De fato, Hume asseverava que não se podia encontrar
nenhum “produto engenhoso entre os [negros], nenhuma arte, nenhuma ciência”.
Contudo, tais assertivas
eram erradas. The World Book Encyclopedia (1973)
observou: “Reinos de negros, altamente desenvolvidos, existiam em várias partes
da África centenas de anos atrás. . . . Entre 1200 e 1600, uma
universidade negro-árabe floresceu em Timbuktu, na África Ocidental e tornou-se
famosa por toda a Espanha, África do Norte e Oriente Médio.” Não obstante, os
envolvidos no comércio de escravos foram rápidos em adotar o conceito de
filósofos, tais como Hume, de que os negros eram uma raça inferior aos brancos,
deveras, até mesmo subumanos.
Religião e raça
Os mercadores de escravos
obtiveram de líderes religiosos considerável apoio aos seus conceitos racistas.
Já na década de 1450, os editos de papas católico-romanos sancionavam a
subjugação e a escravização de “pagãos” e “infiéis” para que as suas “almas”
pudessem ser salvas para o “Reino de Deus”. Tendo recebido a bênção da igreja,
os primitivos exploradores europeus e mercadores de escravos não tinham
escrúpulos quanto ao tratamento brutal de povos nativos.
“Na década de 1760, bem
como em muitas décadas depois, a escravidão negra era sancionada por clérigos e
teólogos católicos, anglicanos, luteranos, presbiterianos e reformados”, diz o
livro Slavery and Human Progress (Escravidão e
Progresso Humano). “Nenhuma igreja ou seita moderna procurou desencorajar seus
membros de possuírem ou até mesmo de traficarem escravos negros.”
Embora algumas das igrejas
falassem a respeito de fraternidade cristã universal, elas também promoviam
ensinos que intensificavam a controvérsia racial. Por exemplo, a Encyclopaedia
Judaica diz que “foi apenas depois de prolongadas lutas e discussões
teológicas que os espanhóis reconheceram que as raças nativas que encontraram
na América eram homens dotados de almas”.
A implicação era que
contanto que as “almas” das pessoas dessas raças nativas fossem “salvas” por
serem convertidas ao cristianismo, não era importante como eram tratadas
fisicamente. E, no caso dos negros, muitos líderes religiosos argumentavam que
eles de qualquer maneira eram amaldiçoados por Deus. As Escrituras eram mal
aplicadas para tentar provar isto. Os clérigos Robert Jamieson, A. R.
Fausset e David Brown, em seu comentário bíblico, afirmam: “Maldito seja
Canaã [Gênesis 9:25] — essa condenação foi cumprida na destruição
dos cananeus — na degradação do Egito, e na escravidão dos africanos, os
descendentes de Cã.” — Commentary, Critical and Explanatory,
on the Whole Bible.
O ensino de que o
antepassado da raça negra foi amaldiçoado simplesmente não consta na Bíblia. A
verdade é que a raça negra descende de Cus, não de Canaã. No século 18, John
Woolman argumentou que usar essa maldição bíblica para justificar a escravização
dos negros, privá-los de seus direitos naturais, “é uma suposição
grosseira demais para ser aceita na mente de qualquer pessoa que sinceramente
deseje ser governada por princípios sólidos”.
Pseudociência e raça
A pseudociência também
acrescentou a sua voz num esforço de apoiar a teoria de que os negros são uma
raça inferior. O livro Ensaio Sobre a Inigualdade das
Raças, do escritor francês do século 19, José de Gobineau, lançou o
fundamento para muitas obras que se seguiram. Nela, Gobineau dividiu a humanidade
em três raças distintas separadas em ordem descendente de excelência: branca,
amarela e negra. Ele afirmou que as qualidades ímpares de cada raça estavam
encerradas no sangue, de modo que qualquer mistura através do casamento
resultaria em degradação e perda das qualidades superiores.
Gobineau argumentou que
existia outrora uma raça pura de pessoas brancas, altas, de cabelos loiros e
olhos azuis, chamadas de arianos. Foram os arianos, argumentou ele, que
introduziram a civilização e o sânscrito na Índia, e foram os arianos que
estabeleceram as civilizações da Grécia e da Roma antigas. Mas, através do
casamento inter-racial com as pessoas locais inferiores, essas outrora
gloriosas civilizações se perderam, junto com a genialidade e as qualidades excelentes
da raça ariana. As pessoas mais próximas do arianismo puro que ainda restavam,
afirmava Gobineau, encontravam-se no norte da Europa, a saber, entre os
nórdicos, e, por extensão, entre os povos germânicos.
Os conceitos básicos de
Gobineau — a divisão em três raças, a linhagem do sangue, a raça ariana,
— não tinham qualquer base científica, e são completamente desacreditados
pela comunidade científica moderna. Não obstante, foram prontamente adotados
por outros. Entre estes havia um inglês, Houston Stewart Chamberlain, que ficou
tão apaixonado pelos conceitos de Gobineau que fixou residência na Alemanha e
promoveu a causa de que apenas através dos alemães havia esperança de preservar
a pureza da raça ariana. Obviamente, os escritos de Chamberlain passaram a ser
amplamente lidos na Alemanha, e o resultado foi vil.
O vil resultado do racismo
Em seu livro Mein Kampf
(Minha Luta), Adolf Hitler afirmava que a raça alemã era a super-raça ariana
que estava destinada a dominar o mundo. Hitler achava que os judeus, que
segundo ele eram responsáveis de sabotar a economia alemã, eram um obstáculo a
este glorioso destino. Seguiu-se assim o extermínio de judeus e de outras
minorias na Europa, que foi indiscutivelmente um dos mais negros capítulos da
história humana. Este foi o desastroso resultado dos conceitos racistas,
incluindo os de Gobineau e de Chamberlain.
Mas tal vileza não se
limitou à Europa. No outro lado do oceano, no chamado novo mundo, o mesmo tipo
de conceitos infundados trouxe indizível sofrimento a gerações de pessoas
inocentes. Embora os escravos africanos fossem finalmente libertados nos
Estados Unidos depois da Guerra Civil, em muitos estados promulgaram-se leis
que proibiam os negros de terem muitos dos privilégios que outros cidadãos
tinham. Por quê? Os cidadãos brancos achavam que a raça negra não tinha a
capacidade intelectual de participar em deveres cívicos e no governo.
Exatamente o quanto tais
sentimentos raciais estavam entrincheirados pode-se ilustrar por um caso
envolvendo uma lei de antimiscigenação. Esta lei proibia casamentos entre
negros e brancos. Ao condenar um casal que violou essa lei, certo juiz disse:
“O Deus Todo-Poderoso criou as raças branca, negra, amarela, malaia e vermelha,
e Ele as colocou em continentes separados, e, se não houvesse interferência no
Seu arranjo, não haveria motivo para tais casamentos.”
O juiz disse isto, não no
século 19, e tampouco numa área primitiva e remota, mas em 1958 — e não a
mais de 100 quilômetros do Capitólio dos EUA! De fato, foi só em 1967 que a
Suprema Corte dos EUA invalidou todas as leis contra os casamentos
inter-raciais.
Tais leis discriminatórias
— bem como a segregação em escolas, igrejas, e outras instituições
públicas, e a discriminação no emprego e na moradia — levaram aos
distúrbios civis, aos protestos e à violência que se tornaram as realidades da
vida nos Estados Unidos e em muitos outros lugares. À parte da destruição de
vidas e de propriedades, a angústia, o ódio e as indignidades e os sofrimentos
pessoais resultantes podem ser apenas considerados como a vergonha e a desonra
de uma chamada sociedade civilizada.
Assim, o racismo tornou-se
uma das mais divisórias forças que afligem a sociedade humana. Certamente, cabe
a todos nós esquadrinhar o nosso coração, perguntando-nos: rejeito eu quaisquer
ensinos que proclamem uma raça como superior à outra? Tenho procurado livrar-me
de quaisquer possíveis resquícios de sentimentos de superioridade racial?
É também apropriado
perguntar: Que esperança existe de que o preconceito e a tensão raciais, tão em
voga hoje em dia, possam algum dia ser erradicados? Podem pessoas de diferentes
nacionalidades, idiomas e costumes viver juntas em paz?
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