segunda-feira, 6 de agosto de 2012

ÁFRICA NEGRA:Nação civilizada e berço da Humanidade Parte I


ÁFRICA NEGRA
Nação civilizada e berço da Humanidade
Parte I
 Mitos ahistóricos da historicidade das sociedades africanas
Por: Domingos Segredo٭

Desde o processo de roedura da África, anterior a conferência de Berlim, e com a estada dos portugueses por volta de 1430, devido a necessidade de manutenção do reino de Portugal, a África foi o cerne das mais diversas autoridades potenciárias européias que alucinadas por filosofias antropológicas criaram teorias, inteiramente, racistas sobre o «Negro» e, mais, sobre a «África». A principal tendência da cultura europeia começava a considerar de forma mais desfavorecida as sociedades africanas e a declarar que elas não possuem uma história digna de ser estudada. Esta mentalidade resultou da convergência de correntes oriundas do renascimento, do iluminismo e da crescente revolução científica e industrial. 
As primeiras idéias sobre a inexistência da história das sociedades africanas foram expressas pelo filósofo alemão de grande renome J. G. Frederic Hegel (1770-1831), no seu discurso sobre filosofia da história (1830), Hegel declarava: “A África não é um continente histórico, ela não demonstra nem mudança nem desenvolvimento, [os africanos] são incapazes de desenvolver e de receber educação. Eles sempre foram tal como os vemos hoje”. Na mesma concepção de idéia Coupland, em 1928, no seu manual L´histoire de l´Afrique Oriental, dizia: “A África propriamente dita não tivera história até David Livingostne. A maior parte dos seus habitantes tinha permanecido durante tempos imemoráveis, mergulhados na barbárie. Tal fora, ao que parece, o desígnio da natureza. Eles permaneciam no estagnamento, sem avançar nem recuar”. Ainda na mesma vertente, sem pestanejar, Gaxote, na sua obra recue de paris (1957), escreveu: “Os povos da África nada deram à humanidade (...), nada produziram”. Em 1864, James Bruce, na sua obra Mission to Gelele, King of Dahomey e numa notável digressão sobre o lugar do negro na história pode se ler frases como: “O negro puro se coloca na família humana debaixo das [demais raças], e prossegue, o negro não progredirá além de um determinado ponto que não merecerá consideração, porque mentalmente ele permanece uma criança adulta”.
Já Oliveira Martins, no seu livro O Brasil e as Colônias Portuguesas, escrito em 1889, enfatizava a seguinte teoria desprovida de qualquer nexo científico: “...Sempre o preto (...) é uma criança adulta. A precocidade, a mobilidade, a agudeza própria das crianças não lhes faltam; mas essas qualidades infantis não se transformam em faculdades intelectuais superiores. (...) É um tipo antropologicamente inferior, próximo do antropóide, e bem pouco digno do nome homem”. Com base na visão pseudocientífica sobre a inferioridade do negro e sua escolarização, Oliveira Martins continua: “A idéia de uma educação dos negros é absurda, não só perante a história, como perante a capacidade mental dessas raças inferiores”. Pois o facto de os negros parecerem como seres humanos e agir como seres humanos não lhes faz necessariamente sensíveis seres humanos [intelectuais], (...) nós [brancos] somos superiores aos pretos”, dizia Peter W. Botha em 1985.
No entanto, contra estas teorias [todas do século XIX] insurge-se um homem negro de formação multifacética, como diz o professor Boubakar Namori Keita em seu ensaio de reflexão (2008), com vasta erudição impregnada de rigor e profundidade: Cheikh Anta Diop (1923-1986). Historiador, químico, físico nuclear e antropólogo, que manejava com facilidade, seriedade e profundidade científica, métodos, técnicas e dados destes ramos de conhecimento para utilizá-los na reconstrução da história da África.
٭ Historiador e linguísta.
Caixa de texto: ٭ Historiador e linguísta.



É por meio dos estudos de Diop que se sabe, hoje, que a primeira das grandes civilizações mundiais antes da Babilônia, Síria, Medo-Persa e Grega, o antigo Egipto ou civilização do Nilo pertencia a povos de tez negra conhecedora da escrita que remonta do V milênio; que os egípcios negros são inventores de um calendário de cerca de 4236 anos antes de Cristo, coerente de 365 dias; que os estudiosos ou “cientistas” gregos, muitos deles filósofos (hoje os mais referenciados), iam ao Egipto receber ensinamentos junto a sacerdotes egípcios negros; que as primeiras expedições marítimas, atlânticas, foram obras do Mansa Bocori ou Abubakari IIº em 1311; que não foi Cristóvão Colombo o primeiro a se encontrar nas caraíbas e na América do Sul, mas que tinha sido precedido por um soberano negro da África Ocidental que, por sua vez, também encontrou outros negros cuja presença data de antes do século X; que os povos da África Oriental conheciam a Índia e, melhor, as rotas do índico antes de Vasco da Gama.

Não se deve esquecer a magnífica obra de Yves Antoine: inventores e sábios negros (1999). Surpreendente por ir de encontro à imagem que se faz do homem negro, do qual circunscreve a capacidade criadora a domínios bem preciso como a música, o desporto e a dança... A verdade é que nomes como Wolé Soyinka (Prémio Nobel de literatura de 1986) e de Muhammad Ali (três vezes campeão do mundo de boxe), Koffi Anan (ex-secretário das Nações Unidas por dois mandatos), Harry Belafonte, Nelson Mandela e Pelé são mais ou menos familiares à maior parte dos cidadãos Ocidentais e de outros continentes, embora difícil seja citar nomes de cientistas negros de alto nível.

Mas quem sabe que a primeira operação ao coração foi efectuada pelo Doutor Daniel Hale Willians no ano de 1893 em Chicago? Quem é que está ao corrente de que o químico americano Washington Carver extraiu da batata mais de uma centena de produtos, tais como farinha, tinta, tapioca, amido e borracha sintética? Que os sinais luminosos para circulação automóvel foi inventado pelo negro americano Garrett Morgan? Que a Dra. Evelyn Boyd Granville e Mae Jemison estiveram, respectivamente, ao serviço da NASA e da IBM. A lista é enorme.

E enfim, todas as teorias do século XIX visavam ocultar o contributo do homem negro à humanidade e coisificá-lo para melhor o dominar ou frustrar os seus desejos ou as suas tentativas de identificação com modelos legítimos e tende a aniquilar a sua confiança de auto-estima. No fundo, ocultar trabalhos importantes do homem negro é como forma de «violência simbólica», segundo as palavras de Pierre Bourdieu.

Portanto, os trabalhos de muitos amantes da África revelam uma nova dimensão do universo dos negros, cujos subsídios à ciência e à técnica modernas, embora tivessem sido durante muito tempo escondidos à face do mundo, nem por isso foram menos apreciáveis.


Fontes de pesquisa:

              I.      ANTOINE, Yves: “Inventores e Sábios Negros”, Ed. Nzila, Luanda, 2009.
            II.      KEITA, Boubakar Namori: “Cheikh Anta Diop: Contribuições Endógena Para a Escrita da História do Continente – Ensaio de Reflexão Sobre Uma Obra”, Ed. Nzila, Luanda, 2008. 
         III.      KI-ZERBO, Joseph et all: “História Geral da África Negra-metodologia e pré-história africana”, Vol.I, Ed. Ática, São Paulo, 1980.
          IV.      M´BOKOLO, Elikia: “África Negra: História e Civilizações do Século XIX aos Nossos Dias”. Vol. II, 2ª Ed, Editora Calibre, 2007.
            V.      PARREIRA, Adriano: “A Maquina de Dúvidas: Conceito de Negro na Literatura de Viagem Sobre Angola – século XV-XVII”, Ed. INALD, Luanda, 1998.
          VI.      VIEIRA, Laurindo: “Angola: Dimensão Ideológica da Educação”, Ed. Nzila, Luanda, 2007.

Por Domingos Segredo Manuel, licenciando em Ciências da Educação - História

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