INTRODUÇAO
Napoleão disse, certa vez, que geografia é destino.
Com isso, ele queria enfatizar que os países e os povos têm sua existência e
cultura determinada pela situação que ocupam no mapa geopolítico do continente
a que pertencem. A nenhum outro país europeu aplica-se melhor isto do que à
Polónia, nação eslava situada na Europa do Leste, fronteira entre dois mundos
hostis. Estas palavras de Napoleão são confirmadas por Jean-Jacques Rousseau ao
afirmar: “A Polónia é um grande Estado
cercado de Estados ainda maiores e que possuem uma grande força ofensiva devida
ao despotismo e à disciplina militar”.[1]
Hoje a Polónia
é uma área um pouco superior a 300 mil km², coube à terra de Copérnico ficar
numa espécie de limbo geopolítico, sempre ameaçado de ser assaltado por qualquer
um dos pontos cardeais que a cercam. A Polónia, por igual, separa dois mundos
culturais, étnicos e religiosos muito distintos: o germano e o eslavo. Ao seu
oeste e ao norte, território das antigas tribos germânicas, encontram-se os
prussianos, os saxões e os suecos de fé luterana, ao sul, os austríacos
católicos. Ao leste, habitam os russos de fé cristã ortodoxa. Para agravar sua
delicada posição estratégica, a partir do século XVI, ao sul avolumou-se a
presença do Império Turco Otomano.
Assim, foi esta
situação geográfica, fragilizada ainda mais por ser um país de extensas
planícies, destituído de protecções naturais, que modelou a vida e a história
da Polónia nos últimos séculos.
Quando seus
vizinhos estavam em paz entre si, tendiam a partilhar o território polaco entre
eles; quando estavam em guerra, faziam-na sobre as terras polonesas.
Historiadores apontam como um factor que realçou a debilidade política do reino
polaco o fato da Szlachta[2], a nobreza local
não ter jamais aceitado a existência de um sistema centralizado, algum tipo de
monarquia absolutista como a que vingou na França, na Espanha e em outros
países europeus a partir do século XVI, que, entre outras coisas, mostrou-se um
instrumento eficaz na defesa do Estado-Nacional em construção.
Na execução deste trabalho fomos levados a fazer as
seguintes questões: o que era a Polónia antes das partilhas? Que motivos
levaram os países vizinhos partilharem os territórios da Polónia?
Todavia, para a execução deste trabalho tivemos que
dividi-lo em dois capítulos. No primeiro capítulo fizemos uma análise, em
termos gerais, no período polaco antes das partilhas, desde a primeira
República nobiliária, constituída através do tratado de 1569 entre a Polónia e
a Lituânia, República esta que se denominou, também, República dos dois povos;
o desenvolvimento cultural polaco; até as ameaças dos países vizinhos e a
consequente decadência do Estado no princípio da segunda metade do século
XVIII.
No segundo capítulo fizemos uma abordagem descritiva
das guerras travadas nos territórios polacos, as quais resultaram em partilhas
e assenhoreadas por nações vizinhas. Outro aspecto não menos importante tem que
ver com as revoltas de povos polacos contra a imposição estrangeira e para da
liberdade nacional.
Ora, uma vez desconhecida
pela maioria a história da Polónia e dos polacos, esse trabalho mostra-nos um
certo interesse na medida em que, fica bem patente o verdadeiro épico que foi a
história dos poloneses em direcção à liberdade e a independência política,
somente há pouco alcançada.
O principal objectivo deste trabalho é analisar as
causas que levaram as sucessivas divisões do território polaco e avaliar o
impacto dimensional das consequências das mesmas na vida social, económica e
geopolítica da Polónia.
As metodologias e técnicas utilizadas para a
elaboração deste trabalho foram as técnicas de pesquisa bibliografia, e ainda
utilização do método histórico. Utilizamos, também, o método comparativo devido
as análises de autores que teceram diferentes abordagem acerca do assunto em
estudo.
Retornando ao tema central como nosso campo de
análise, gostaríamos de afirmar que no trabalho que aqui apresentamos não
pretendemos abordar toda história das partilhas da Polónia, importa apenas
salientar alguns aspectos gerais na medida em que esta referência nos poderá
ajudar a compreender a visão do colonialismo sobre colonizado.
E O
DESENVOLVIMENTO DO SÉCULO ÁUREO POLACO.
A inexistência
de um sistema centralizado, algum tipo de monarquia absolutista, permitiu a
adopção do princípio do liberum veto[3]pela Sejm
(Assembleia da Nobreza), a partir de 1652, implicava que qualquer integrante da
instituição, lançando mão do poder de veto, podia paralisar o poder executivo.
Deste modo, ao enfraquecer o braço do rei, pouca coisa podia esperar-se de ele
ser eficaz em realizar uma boa guarda das fronteiras nacionais. No corpo
político polonés daqueles tempos, como inúmeros tratadistas constataram, os
membros paralisavam a cabeça. Isso promovia a institucionalização da anarquia e
não da liberdade.
Todavia, a
ausência de um estado forte não foi impedimento para que a união entre o reino
da Polónia e o grão-ducado da Lituânia, abarcando então vastas extensões de
terra da Ucrânia, fizesse desta aliança o segundo reino mais extenso da Europa;
tal situação durou por quase um século (dos 1.140 mil km² que possuía na
ocasião viu-se reduzida a 990 mil km², em 1634).
O acordo
polaco-lituano, resultado do Tratado de Lublin, de 1569, foi denominado de Rzeczpospolita
Obojga Narodów–também conhecido como a República dos Dois Povos
– estendeu-se por quase um século, naufragando definitivamente em 1795.
A aproximação
entre poloneses e lituanos, surgida devido à ameaça de expansão do Czarado de
Ivan, o Terrível, foi selada por uma coroa em comum encabeçada por um monarca
escolhido pela Electio Viritim, um
processo de eleição do rei feita nos moldes do sistema praticado pelo Sacro
Império Romano-Germano, havendo ainda a presença activa do Sejm, com poderes
ressaltados.
O senado
(composto por 81 bispos e demais dignitários) e a assembleia (formada por 54 posels, deputados representantes dos sejmiks, comarcas locais) tornaram-se
árbitros dos destinos dos reis poloneses, impedindo a formação de um estado
forte (sem que o regime polonês evoluísse para uma monarquia parlamentar de
molde ocidental).
O rei, ainda
que bem pouca autoridade de fato exercesse, tinha o atributo de distribuir os
cargos e as funções públicas como compensações aos serviços prestados ao
estado, as ditas panis bene meritorum(a
distribuição do pão merecido), que mesmo não sendo remunerados, resultavam
na extracção de bons rendimentos aos seus dignitários.
O promissor
século XV foi a preparação para o século XVI, que na história da Polónia é
chamado “o século áureo”. A área da
Polónia e da Lituânia era na época de cerca de 815 km2 e a população
de cerca de 8 milhões de habitantes. Os camponeses constituíam cerca de 67% da
população, os citadinos cerca de 23% e a nobreza, juntamente com o clero, cerca
de 10%.
A exportação
de cereais e o saldo positivo comercial asseguravam à Polónia bem-estar e
significativo crescimento demográfico. Na esfera politica foi um período de
potência e de ausência de ameaças. As poucas guerras foram levadas a cabo
apenas nas periferias da Polónia e da Lituânia. Por sua vez, na cultura foi o
século da Renascença e do desenvolvimento da literatura em língua polaca.
O seu alto nível de ensino permitiu à nobreza chegar ao poder e criar uma forma
de sistema tipicamente polaca – a República nobiliária.
As influências
da cultura renascentista chegaram à Polónia a partir das últimas décadas do
século XV. Nisso influíram as viagens da juventude para os estudos, os
contactos diplomáticos, dinásticos e comerciais.
No século XVI
teve lugar um particular desenvolvimento da renascença polaca. As bases da
mesma foram criadas pelo grupo relativamente numeroso de compradores de obras
artísticas, composto da nobreza culta e da burguesia, bem como do mecenato
real, episcopal e dos magnatas.
O centro da
cultura polaca era Cracóvia, por causa da sua corte real, Universidade, do meio
dos tipógrafos cracovianos, dos atelieres (oficina) de cultura e arquitectura
aí existentes. Esta renascença irradiando por todo o país, desenvolveu-se sob
influência italiana.
A renascença
polaca foi evidente, também, na literatura[4], na
ciência[5] e na
tolerância religiosa[6].
Os privilégios
que a nobreza obteve nos séculos XIV e XV foram estendidos à nobreza lituana,
como também aos senhores feudais ortodoxos da parte russa do Grão- Ducado
Lituano. Foi um fenómeno de grande significado para a configuração de um
homogéneo – sob o ponto de vista dos direitos e aspirações – grupo social,
composto de pessoas de diferentes religiões e idiomas. A unidade política da
nobreza e a sua actuação comum em favor da conquista do poder dominaram sobre
as divisões regionais, étnicas e religiosas.
Entre os privilégios nobiliários decisivos
para a configuração do novo sistema estatal encontravam-se os privilégios de Nieszawa, que era a obrigação do rei de
ouvir as opiniões da nobreza e obter a sua aprovação para a cobrança de
impostos e para a condução de guerras, o que implicava a necessidade do envio
de funcionários reais às Assembleias regionais (pequenos parlamentos) da
nobreza.
Dada a longa
duração de tais práticas consultivas estabeleceu-se, no século XV, a prática de
envio de deputados dos parlamentos regionais a uma assembleia nacional, em que
participavam, além dos deputados, o conselho real e o próprio monarca. Assim se
formou, em 1493, o parlamento geral composta de duas câmaras[7],
comum para ambos os Estados da Polónia e da Lituânia.
A partir do
final do século XV até os anos sessenta do século XVI desenvolveu-se uma luta
pelo poder entre a alta nobreza (magnatas) e a nobreza comum.
Após o
desaparecimento da Dinastia dos jagellons em 1572, a nobreza criou
confederações regionais, defendendo a ordem estatal. Desenrolava-se o litígio
sobre a forma de eleição – unicamente através do senado ou através de toda a
assembleia. Jan Zamoyski, líder do agrupamento da nobreza lançou o lema da
chamada eleição livre, efectuada pessoalmente por cada nobre presente nos debates.
A assembleia
convocatória de 1573 aprovou essa solução, como também a acta da chamada confederação varsoviana, que introduzia
a tolerância religiosa e a proibição de guerras religiosas. Uma vez que a paz e
a tolerância religiosa eram um fenómeno incomum na Europa abalada pelas guerras
religiosas. Desta feita, reis estrangeiros começaram a serem eleitos para
ocupar o trono em Cracóvia (então cidade sede do reino).
A primeira
eleição livre teve lugar em 1573. A nobreza elegeu para rei Henrique de Valois.
Foram-lhe apresentados para juramentar os chamados Artigos Henriquinos, que
definiam os princípios do sistema social da Polónia e da Lituânia.
O futuro rei
teve que renunciar da sucessão do trono e reconhecer o princípio da eleição
livre, as prerrogativas da assembleia, o direito do senado em controlar a
política externa, jurando tolerância religiosa. No caso da violação dessas
leis, a nobreza tinha a possibilidade de recusar obediência ao rei.
Henrique de
Valois reinou por curto período, pois em 1574, face à notícia da vacância do
trono francês, fugiu da Polónia. Para seu sucessor foi eleito o príncipe da
Transilvânia, Estêvão Barthori (1576-1586). Este renunciou de suas
prerrogativas judiciais face à nobreza. Em lugar do tribunal real foram criados
os tribunais de recursos, em que os juízes eram eleitos pela nobreza.
Entretanto, o
tribunal real foi mantido para questões particularmente importantes, e as suas
reuniões tinham lugar em presença da assembleia.
As reformas
jurídicas de Estêvão Barthori terminaram na formação do sistema estatal da
Polónia e da Lituânia como monarquia
e, ao mesmo tempo, como República
nobiliária.
A igualdade de
direito de toda a nobreza, as prerrogativas da assembleia, o controlo estendido
sobre o poder real, a tolerância religiosa – constituíram as bases desta
democracia fidalga. Este era um sistema original, atraente, assegurando à
nobreza direitos cívicos, completamente distinto dos sistemas políticos
absolutos dominantes na Europa.
Aproveitando a
conjuntura económica e ocupada com as questões da luta pelo poder, a nobreza
era contrária à condução de guerras. Entretanto, a partir do final do século XV
a lituânia lutava contra a expansão do Principado Moscovita e nessas lutas
sofreu significativas perdas territoriais. A constante pressão moscovita
estreitou a união polaco-lituana.
1.1 A POLÓNIA FACE ÀS AMEAÇAS E
A CRISE DO SISTEMA ESTATAL.
Já no final do
século XVI surgiram ameaças à República, que aumentaram à medida do passar do
século XVII. A correlação das forças internacionais não era favorável à Polónia
e à Lituânia. Pois a Suécia em potência crescente, lutava pelo domínio no
báltico e nos seus litorais, o que tinha que levar ao embate com a Polónia. A
Rússia realizava o seu programa de dominação de todas as terras e povos
ortodoxos – o que a colocava em conflito com a Lituânia e com a Coroa. A
Turquia, após a conquista da Hungria, dirigia a expansão, entre outras, para as
áreas do sul da República. Estas eram também objectos de invasões tártaras com
o fim de pilhagem.
Rivalizando
com a República pela dominação na Europa Central, porém enfraquecidos pela
guerra de trinta anos, os Habsburgos não eram aliados seguros. No limiar dos
séculos XVI e XVII a abastada República encontrava ainda bastante forças para
fazer frente a essas ameaças, inclusive para tentar a expansão.
No decorrer do
longo reinado de Sigismundo III (1587-1632), originário da dinastia sueca dos
Vasas, extinguiam-se gradualmente as tendências desenvolvimentistas na economia
e as aspirações reformadoras da nobreza. Contudo aumentava o temor da mesma
face ao absolutismo do poder real. A política do monarca, indo nessa direcção,
foi detida pela revolta armada da nobreza chamada revolta de Zebrzydowski.
O grupo dos
magnatas, interessado pela expansão em direcção leste, tentou aproveitar a
desordem no Grão-Ducado Moscovita, após a extinção da dinastia dos Rurikowisczs
aí reinante. Isso levou a República à guerra com a Rússia.
Após a vitória
decisiva do comandante Stanislaw Zólkiewski nas cercanias Kluszyn em 1610, o exército
polaco entrou em
Moscovo. Entretanto , isso durou pouco, porque tive fim a
desordem no Grão-Ducado Moscovita com a eleição á czar, Miguel Romanov, que deu
início à nova dinastia russa. A suspensão da guerra deu-se em 1619 e deixou à
República a cidade de Smolensk, o que foi validado pela paz de Polanów no ano de 1634.
Na guerra com
a Turquia (1620-1621) pela parte polaca distinguiram-se os destacamentos dos
cossacos[8]. Os
poderes estatais não estavam em condições de controlar as actividades dos cossacos.
Em 1648
eclodiu a grande revolta dos cossacos, encabeçada por Bohdan Chmielnicki.
Aliaram-se a eles os camponeses da Ucrânia, e a revolta transformou-se em
insurreição social e nacional contra o poder polaco. Esta desequilibrou as
bases da República, cujas camadas governantes não foram capazes de solucionar o
problema cossaco e ucraniano dentro do espírito das soluções polaco-lituanas,
não se tendo decido por reconhecer à Ucrânia os direitos de terceiro membro da
República. Como obstáculo ergueram-se os interesses dos magnatas, cujos
latifúndios se encontravam justamente na Ucrânia, bem como os conflitos
religiosos e étnicos.
O rei João Casimiro (1648-1668) tentou
pertratar com Bohdan Chmielnicki, cujo exército chegou até as cercanias de
Lvov, devastando as terras conquistadas, matando os membros da nobreza e
assassinando a população judia nas cidades. Os cossacos hesitaram quanto à sua
política, e concluíram alianças com a Turquia, Polónia e Rússia, dependendo da
conjuntura.
Em 1654, no
chamado Conselho de Perejaslaw, os
cossacos puseram-se sob a protecção de Moscovo. Dois exércitos russos
penetraram profundamente nos territórios da enfraquecida República. Nessa
situação extremamente perigosa, caiu sobre a República a invasão sueca em 1655.
No decorrer de
alguns meses os exércitos suecos ocuparam a maioria dos territórios polacos,
além dos que foram ocupados pelos exércitos russos. Cracóvia e Varsóvia caíram
nas mãos destes, embora fosse defendida por Stefan Czarnieck. Apenas Gdansk
rebateu eficazmente os suecos. O rei Casimiro fugiu da Polónia para Silésia.
A derrota
inesperada da República abalou tão profundamente a correlação de forças na
Europa Centro-Leste e Norte que a polónia recebeu ajuda do Império Alemão,
enquanto a Rússia suspendeu as acções bélicas.
Mas na própria
República que os suecos trataram como troféu militar e pilharam
desapiedadamente, aumentava a resistência armada. A nobreza, os citadinos e,
pela primeira vez em tal escala na história polaca, também os camponeses,
organizaram destacamentos guerrilheiros.
Em Novembro e
Dezembro de 1655, os suecos cercaram Jasna Góra (a montanha clara)[9]. Sua
defesa bem sucedida tornou-se a divisa para uma resistência mais forte. O rei
João retornou ao país. A maior fama como comandante conquistou Stefan
Czarnieck.
Os suecos
foram expulsos da Polónia. Em Maio de 1660 foi assinada a paz polaco-sueca em
Oliwa, dentro do princípio do status quo
de antes da guerra. Foram derrotados também os cossacos. Por força do
armistício em Andruszów (1667), a Rússia obteve Smolensk, a Ucrânia da margem
esquerda e – por dois anos – Kiev. Essas condições, ficando Kiev para a Rússia,
foram confirmadas pela paz de 1686.
A República
que teve também de lutar contra as invasões turcas (1672-1673), concluiu
alianças com os Habsburgos. Quando em 1683 o potente exército turco cercou
Viena, a capital do Império foi libertada graças ao socorro polaco. Os exércitos
unidos dos aliados foram comandados pelo rei João III Sobieski (1674-1696).
Portanto, a
maioria das longas guerras da segunda metade do século XVII foram travadas no
território da Polónia e Lituânia. A República rechaçou as invasões com grande
esforço. Saiu, contudo, das guerras extremamente arruinada e despovoada. As
guerras foram acompanhadas de epidemias e fome. Em resultado a população, que
antes de 1654 era de cerca de 10 milhões de habitantes, no final do século
diminuiu para 6 milhões. Diminuiu também a exportação, a moeda perdeu valore a
reconstrução da economia acontecia de forma extremamente lenta.
A crise
atingiu também a organização política do Estado. A posição da nobreza no Estado
enfraqueceu devido ao seu empobrecimento e à perda da independência.
Aproveitando o sistema de clientela, os magnatas obtiveram supremacia. A
assembleia foi enfraquecida pela aplicação do “liberum veto”. As constituições parlamentares eram aprovadas
ordinariamente com a concordância de todos os deputados, mas a partir da metade
do século XVII a minoria submetia-se a maioria.
Em 1652 foi
pela primeira vez reconhecido que a importância da vontade da maioria à pelo
menos um deputado constituía uma violação da liberdade. Assim, a assembleia
podia ser rompida pela objecção de um deputado.
Dentro de
curto prazo o liberum veto tornou-se instrumento para o agrupamentos de
magnatas que se rivalizavam entre si e mais tarde também para as influências
estrangeiras. Face à paralização da Dieta, as assembleias locais assumiram o
papel daquela. Isso trouxe a descentralização do Estado.
1.2. TENTATIVAS DE REFORMAS E
A DECADÊNCIA DO ESTADO.
O começo do
século XVIII foi o período da mais profunda decadência da República. No reinado
de Augusto II, o Poderoso (1697-1733), na época da guerra chamado do Norte, a
Polónia foi campo passivo de batalhas de exércitos estrangeiros, e até o trono
real se tornou objecto de competição internacional.
As monarquias
vizinhas centralizadas e absolutas ampliaram os seus exércitos; a Rússia dispunha
de 330 mil soldados, a Prússia e a Áustria cerca de 150 mil soldados cada uma.
A nobreza, inconsciente da situação ameaçadora, estava convencida de que, como
a República na ameaçava a ninguém com o seu exército de 24 mil soldados, então
não seria alvo de agressão.
Na política
interna a nobreza vigiava a sua “liberdade
douradura”, não compreendendo que o desorganizado sistema político já não
lhe assegurava a liberdade.
A actividade
reformadora encontrou dois obstáculos difíceis de serem superados. O primeiro
era a política das potências vizinhas, que viam seu interesse na preservação da
inércia política na república. O segundo era a ignorância de grande parte da
nobreza e a aversão aos sacrifícios materiais e políticos.
Por esse
motivo a preparação das reformas exigia a educação duma geração abnegada e
culta, livre de preconceitos e ilusões. Assim, em 1740 Stanislaw Konarski abriu
em Varsóvia, para a juventude nobre, uma escola moderna, conhecida como
Colegium Nobilium. Posteriormente numerosas escolas administradas pelos monges
piedosos (Ordem dos Cléricos Regulares de Nossa Senhora das Escolas Piedosas)
basearam-se na mesma.
Quando em 1763
faleceu Augusto III, o agrupamento dos Tchartoryskis que governava a Polónia
acordou com a Rússia a candidatura de Estanilslau Augusto Poniatowski
(1764-1795). Os primeiros anos de seu reinado foram ocupados pelas reformas
militares e financeiras.
Em 1765 o rei
criou a Escola dos Nobres, na qual se formaram grandes líderes polacos como T.
Kosciuszko, J. Jasinski e U. Niemcewicz. Assim surgiu a nobreza revista
conhecida como “Monitor”. Foram
criadas manufacturas, foi ordenada a administração urbana.
Entretanto,
essas reformas defrontaram-se com a oposição da Czarina Catarina II. A
assembleia de 1768, sob pressão dos exércitos russos, aprovou as chamadas leis
cardeais: existência de eleição livre, do liberum veto, do direito à revolução
contra o rei e o monopólio da nobreza sobre a actividade política. Essas leis
seriam garantidas pela czarina Catarina II. Isso significava que nenhuma
reforma a partir de então seria possível sem o consentimento da Rússia.
A brutalidade
da intervenção russa provocou a resistência armada da nobreza, que criou uma
confederação em Bar. As
lutas – de carácter guerrilheiro – duraram 4 anos.
CAPÍTULO II: AS PARTILHAS DA POLÓNIA.
2.1 A PRIMEIRA PARTILHA DA POLÓNIA.
A
política russa em relação à república defrontou-se com um dilema: ou a
manutenção do domínio da Rússia sobre toda a República ou o assentimento às
contínuas proposições da Prússia, quanto a partilha da Polónia. A Rússia era o
mais potente dos vizinhos da República e a decisão encontrava-se nas mãos de
Catarina II.
Se
resignava do domínio indivisível sobre a Polónia e Lituânia dependentes, era
por temer o renascimento da República. Não eram temores sem fundamentos. Antes
de 1772, a República ocupava uma área de 733 Km2, a sua população
era de cerca de 14 mil habitantes e a densidade demográfica de 19,1 habitantes
por Km2. Em contraste a população da Rússia montava a 29 milhões de
habitantes o que face à sua enorme área dava 5,5 habitantes por Km2.
A população da Áustria, juntamente com a Boémia e a Hungria, era de cerca 18
milhões de habitantes, por sua vez a Prússia contava com 2,5 milhões de
habitantes.
Assim,
a República era um país de significativos potenciais e possibilidades, que após
reformas eficazmente conduzidas poderia jogar um papel autónomo na Europa
Centro-Leste. O entendimento das três potências às custas da débil República
foi alcançado em 1772.
Já em 1770 e 1771, a Áustria e a
Prússia tinham tomado alguns territórios fronteiriços da Comunidade polaco-lituana, com a Áustria
tomando o condado de Szepes e a
Prússia incorporando Lauenburg e Bütow. Em 19 de
Fevereiro de 1772,
o acordo da partilha foi assinado em Viena. Um acordo prévio
entre Prússia
e Rússia
foi feito em São Petersburgo em 6 de
Fevereiro de 1992.
No começo de
Agosto, tropas austríacas, prussianas e russas invadiram simultaneamente
territórios da Comunidade polaco-lituana e ocuparam os territórios acordados no
acordo feito em 5 de Agosto.
Os regimentos
da Confederação de Bar, cujo
corpo executivo havia sido forçado a deixar a Áustria (país que havia dado apoio
à confederação anteriormente) depois que o país ingressou na aliança
russo-prussiana, não deixaram suas armas. Muitos fortes sob seu comando
continuaram a lutar pelo maior tempo possível; o Castelo de Wavel em Cracóvia
caiu apenas no final de Abril; a Fortaleza de Tyniec continuou segura até Julho; Częstochowa,
comandada por Kazimierz Pułaski,
conseguiu lutar até o final de Agosto. No final, a Confederação de Bar foi
derrotada, e seus membros fugiram ou foram deportados para a Sibéria
pelos russos.
O tratado da
partilha foi ratificado por seu signatários em 22 de
Setembro de 1772
e representou um grane sucesso para Frederico II: o território ganho pela
Prússia pode ter sido o menor, mas era significativamente relevante e
importante dos pontos de vista estratégico e geopolítico. A Prússia ganhou a
maior parte da Prússia Real, o que permitiu a Frederico unir a
Prússia Oriental com Brandemburgo.
A Prússia também anexou áreas do norte da Grande Polónia, seguindo o curso do rio Noteć (o distrito de Netze) e a Kuyavia,
mas não as cidades de Danzig (também conhecida como Gdansk).
Os territórios incorporados tornaram-se uma
nova província em 1773,
conhecida como Prússia Ocidental. No total, a Prússia ganhou
36.000 km² e aproximadamente 600.000 novos habitantes. Também conseguiu cortar
o acesso da Polónia ao mar e assim ganhar o controle de 80% do comércio
exterior da Comunidade polaco-lituana, e com tão enormes custos, o reino
prussiano acabou por acelerar o inevitável colapso da Polónia-Lituânia.
Apesar do
criticismo da Imperatriz Maria Teresa sobre a partilha, o diplomata austríaco Wenzel Anton Graf Kaunitz
considerou a porção recebida pela coroa austríaca como uma ampla compensação;
apesar de a Áustria ser a potência menos interessada na partilha, ela recebeu a
maior parte da população polaca das áreas ocupadas e a segunda maior porção de
terras (83.000 km² e 2.650.000 de novos habitantes). Pertenciam à Áustria as
cidades Zator
e Auschwitz,
parte da Pequena Polónia e dos condados de Cracóvia
e Sandomierz
(com as ricas minas de sal de Bochnia e Wieliczka) e toda a Galícia, excepto pela cidade de Cracóvia.
A Rússia
recebeu a maior área da Polónia, no nordeste, porém, menos importante em
aspectos económicos. Com este "documento diplomático", a Rússia
recebeu territórios ao leste de uma linha que passava pelos rios Dvina, Drut e Dnieper.
No total, a monarquia russa ganhou 92.000 km² de território e 1.300.000 de
habitantes.
Com a primeira
partilha, a Comunidade polaco-lituana perdeu aproximadamente 211.000 km² de
área (30% de seu território, que até então somava cerca de 733.000 km²) e uma
população de quatro a cinco milhões de pessoas (aproximadamente um terço de sua
população de catorze milhões de habitantes antes das partilhas).
Após ocupar
seus respectivos territórios, as três potências exigiram que o rei Stanisław
August Poniatowski e a Sejm aprovassem suas acções. O rei apelou às nações da Europa
Ocidental por ajuda, e tentou atrasar a convocação da Sejm. Os
outros poderes europeus olhando a partilha com relativa indiferença, e apenas
poucas vozes – como Edmund Burke – se levantaram contra as
potências orientais.
Quando ficou
claro que nenhuma ajuda estava a caminho e os exércitos das nações aliadas
ocuparam Varsóvia
para forçar pelas armas a reunião da assembleia, não houve mais nenhuma
alternativa a não ser a submissão.
Os senadores
que se rebelaram contra as potências foram ameaçados pelos russos,
representados pelo embaixador Otto von Stackelberg, que
declarou que em caso de recusa, a capital inteira seria destruída. Outras
ameaças incluíram execução, confisco de bens e mais ganhos territoriais; alguns
senadores foram capturados pelos russos e exilados na Sibéria.
As assembleias
locais (Sejmiks)
se recusaram a eleger delegados para a Sejm, e depois de grandes dificuldades,
menos da metade dos membros regulares compareceram à reunião liderada por Michał Hieronim Radziwiłł
e Adam Poniński; o último,
em particular, era um nobre polaco que havia sido comprado pelos russos e
seguia suas ordens.
Assim, a Primeira Partilha da Polónia, também
conhecida como Primeira Partilha da
Comunidade polaco-lituana, ocorrida em 1772, foi a primeira das três partilhas que acabou
por pôr fim à Comunidade polaco-lituana em 1795. A primeira partilha
realizada entre o Império Russo, o Reino da
Prússia e o Arquiducado Austríaco, e
que foi ratificada pelo parlamento
polaco (sejm) em 1773.
2.2 A ECLOSÃO DA SEGUNDA E
TERCEIRA PARTILHA DA POLÓNIA.
O
choque da primeira partilha bem como os processos do desenvolvimento económico
e demográfico tiraram a sociedade polaca do letargo. Somaram-se também os
resultados do trabalho educacionais, da publicística, da literatura política –
começou a actuar uma geração de polacos melhor preparados e capazes de
sacrifícios. A activação das cidades e da burguesia culta incluiu esse grupo
social na vida política do país.
A
comissão de Educação nacional, criada em 1773, introduziu nas escolas manuais
modernos, pôs as escolas sob a direcção das Universidades Reformadas. As ideias
da Ilustração, juntamente com as ideias patrióticas e reformadoras foram
popularizadas pela imprensa, literatura, teatro, pintura, música e
historiografia. O centro da cultura tornou-se Varsóvia com os seus cem mil
habitantes, o Teatro Nacional conduzido por Wojciech Boguslawski, as redacções
das revistas, as bibliotecas, e a corte real. O desejo de reformas tornou-se
geral. Entretanto, a sua realização dependia do consentimento da Rússia –
garantidora do sistema da República.
Quando eclodiu a guerra da Rússia com a
Turquia, o rei Estanislau Augusto obteve o consentimento da czarina Catarina II
para a convocação da Dieta nas condições de confederação (isto é, sem o liberum
veto) e para o aumento do número dos efectivos do exército.
Na
atmosfera de grande emoção política, a Dieta de 4 anos, denominada Grande
(1788-1792) aprovou a lei das cidades reais, aumentando as prerrogativas
políticas da burguesia, rompeu as garantias russas, concluiu aliança com a
Prússia e, como resultado de trabalhos de muitos anos, aprovou a Constituição de 3 de Maio de 1791, a
segunda constituição no mundo, após a dos Estados Unidos da América e a
primeira na Europa.
As
suas determinações previam o fortalecimento do poder real e a hereditariedade
do mesmo, a reorganização do governo, o aperfeiçoamento do trabalho da Dieta,
com a preservação das liberdades civis da nobreza – nobres proprietários,
abarcando com as mesmas parte da burguesia.
Foi
liquidada a divisão do Estado na coroa e Lituânia, com isso foi unificado o
sistema político. Os governos baseados na Constituição dispunham de todas as
chances de tirar o país da crise política.
A
Constituição provocou a oposição decidida da Rússia. Sob a sua influência
alguns magnatas – traidores para a defesa do antigo sistema – estabeleceram
confederação em Targowica. A Polónia
foi invadida pelos exércitos russos.
Apesar
da encarniçada defesa polaca através dos comandantes Tadeusz Kosciuszko e o
príncipe Józef Poniatowski, a guerra de 1792 terminou em derrota com o derrube
da Constituição de 3 de Maio e a segunda
partilha da Polónia em 1793, na qual participaram a Rússia e a Prússia. O
restante do território da República – cerca de 200 mil Km2, com
cerca de 4 milhões de habitantes, tornou-se protectorado russo.
Em
1794, sob a chefia de Tadeusz Kosciuszko, rebentou a insurreição que constituiu
uma tentativa de eliminar as partilhas. Foram libertadas Cracóvia, Varsóvia e
Vilnius. A Prússia entrou então na guerra ao lado da Rússia, cercando Varsóvia.
Apesar do enorme esforço militar e material e do heroísmo dos soldados e da
população civil, incluindo os citadinos e camponeses atraídos para a questão
nacional, a insurreição caiu.
Do
seu destino decidiu a derrota nas cercanias de Maciejowice, bem como a
conquista do bairro de Praga, em Varsóvia, por Suworow e o massacre da sua
população. Varsóvia, aterrorizada pela carnificina de Praga, rendeu-se.
Com
a capitulação de Varsóvia deu-se a terceira
partilha da Polónia em 1795. A Prússia apoderou-se da Mazóvia, Varsóvia até
as terras junto ao rio Niemen; a Áustria ficou com as terras entre os rios
Pilica, Vístula e Bug; por sua vez a Rússia apoderou-se das terras entre o rio
Bug e o médio Niemen.
O
Estado polaco foi destruído no período em que as reformas internas e o estado
da educação, bem como da economia, criavam os sólidos fundamentos da sua
existência e desenvolvimento.
2.3 GUERRAS E
INSURREIÇÕES POLACAS DO SÉCULO XIX.
A
partir das partilhas até a primeira guerra mundial, durante 123 anos de
opressão, as sucessivas gerações de polacos empreenderam a tentativa de
recuperação da independência. Entretanto, era difícil contar com a reconstrução
da Polónia sem uma conjuntura internacional favorável. A Rússia, a Áustria e a
Prússia conduziam uma política comum visando a manutenção das conquistas, e
evitando conflitos entre si. Por sua vez, a vitória da Polónia sobre as três
potências, ao mesmo tempo, era impossível.
As
três monarquias ocupantes eram estados absolutos, o sistema das mesmas
encontra-se em completa contradição polaca – de democracia, autonomia e
liberdade cívica da nobreza. Essas tradições eram cultivadas não só pelos
proprietários de terra polacos, pelo clero e pela parte esclarecida dos
citadinos, mas também por um grupo especificamente polaco – a “inteligensia”, isto é, grupo de
funcionários, originários da nobreza e cultivando seus ideias.
2.4 A INSURREIÇÃO DE
1806 E A CRIAÇÃO DO
PRINCIPADO DE
VARSÓVIA.
A
luta dos polacos pela liberdade era uma luta contra a violência e o
absolutismo. Por isso a questão polaca foi vinculada com os movimentos
libertários e democráticos europeus. Isso encontrou expressão na participação
dos polacos nas insurreições e revoluções europeias do século XIX, bem como na
participação de estrangeiros nas insurreições polacas. A frase: “pela nossa e vossa liberdade” tornou-se
o símbolo da contribuição polaca para a democratização dos sistemas europeus.
No
limiar dos séculos XVIII e XIX, o aliado dos polacos era a França de Napoleão.
Em 1797, na Itália foram criadas as legiões polacas, apoiando Napoleão
Bonaparte na guerra contra a Áustria. Nos anos 1806-1807 Napoleão derrotou a
Áustria, a Prússia e a Rússia.
Por
força da paz de Tilsit (1807), das terras da ocupação prussa foi criada o Principado de Varsóvia. Napoleão
concedeu-lhe Constituição, foi criado o governo polaco do Principado,
introduzido o código napoleónico e os camponeses receberam a liberdade pessoal.
Com uma extensão de 155 mil km², o Principado de Varsóvia, contava com uma
população de 4.300.000 habitantes, defendido por 39 mil homens armados.
O renascido
exército nacional fora arregimentado a partir dos poloneses que haviam lutado
ao lado dos franceses, cujos oficiais compuseram o novo quadro militar do
Principado de Varsóvia. Napoleão distinguiu como seu comandante o príncipe Józef
Poniatowski, o Bravíssimo, sobrinho do último rei da Polónia, Estanislau II
Augusto, personalidade nobre que melhor encarnava o espírito romântico do
cavalheiro audaz e destemido, tão ao gosto da tradição dos Sarmatas. O General
Príncipe Poniatowski, montado num corcel fogoso, era a materialização do
ardente desejo de liberdade dos poloneses.
O governo era
formado por um triunvirato e estava submetido a um “Residente” – o
representante de Napoleão – no caso, o Marechal Davout.
A Constituição
do Principado de Varsóvia, expressão do Código Napoleónico, estabeleceu:
a) A igualdade
de todos os cidadãos perante a lei;
b) A abolição
dos privilégios da szlachta(a
nobreza);
c) A abolição
da servidão; e
d) Os direitos
políticos eram estendidos aos nobres e aos burgueses.
A dedicação
das tropas polonesas ao imperador foi integral. Do general ao recruta, todos
ficaram com Napoleão até o fim. Durante a invasão da Rússia em 1812,
registou-se um facto que virou marco da devoção completa dos cavaleiros dos
regimentos de hussardos poloneses por Napoleão. Na travessia do rio Niémen, que separava a Polónia da Rússia, muitos
deles, mesmo sendo tragados pela violência da correnteza, ainda gritavam, lá do
meio do rio caudaloso: “Vive l´Empereur! Vive l´Empereur!”[10].
Sobre
o futuro da Polónia decidiram a derrota de Napoleão na expedição contra a
Rússia em 1812 e as batalhas das Nações nas cercanias de Leipzig (1813) perdida
pela França, na qual pereceu heroicamente o príncipe Józef Poniatowski,
comandante do exército do Principado de Varsóvia.
O
congresso de Viena de 1815 entregou parte do Principado – juntamente com Poznan
– à Prússia, porém do resto de suas terras foi criado o Reino Polaco, instituído pela Rússia. O rei passou a ser o czar
Alexandre I. sob a autonomia do reino decidiam a Constituição que lhe foi
concedida governo próprio, Dieta e exército.
Entretanto,
a conciliação do sistema constitucional do Reino com o sistema despótico da
Rússia era impossível. A incessante violação e os insucessos da oposição legal
levavam a juventude polaca para as organizações conspirativas, que preparavam
uma nova insurreição.
2.5 AS INSURREIÇÕES DE
1830, 1848 E 1863.
A
formação das organizações conspirativas por jovens defensores da causa polaca
coincidiu com o crescimento das perseguições de tudo que era polaco nas áreas
do leste da antiga República, com a destruição da florescente Universidade de
Vilnius e com a revolta dos decabristas (revolucionários constitucionalistas)
na Rússia em 1825.
A
marca da insurreição tornou-se a revolução de Julho de na França, a insurreição
na Bélgica e o projecto russo da intervenção armada, que contava usar os
exércitos do reino para sufocar esses movimentos libertários.
A
insurreição eclodiu em Varsóvia, em 29 de Novembro de 1830. Foi criado um governo
independente, a Dieta detronizou o czar. Teve início a guerra polaco-russa.
Excelentemente treinado armado, o exército do Reino lutou até Setembro de 1831,
porém não podia ganhar essa guerra face aos recursos humanos e económicos da
Rússia. A queda da insurreição trouxe a suspensão da Constituição, a liquidação
do exército do Reino, o encerramento da Universidade e a construção de uma
fortaleza em Varsóvia.
Tudo
que era polaco foi cruelmente perseguido na Lituânia, Bielo-Rússia e Ucrânia,
aplicando-se a deportação e a confiscação dos bens. Foi fechada a Universidade
de Vilnius. Os polacos foram também reprimidos em Poznan pelas autoridades
prussas e na Galíca pelas austríacas.
A
derrota provocou a emigração de cerca de10 mil líderes e participantes da
insurreição. Emigraram principalmente para a França. Em Paris criaram as suas
obras, os poetas Adam Mickiewicz, Juliusz Slowacki, o compositor Frederico
Chopin e o historiador Joachim Lelewel.
As
discussões sobre a preparação da continuação da luta armada conduziam a Sociedade Democrática Polaca; a luta
diplomática pela manutenção da causa polaca era conduzida pelo conde Adam
Czartoryski.
Uma outra
tentativa de levante repetiu-se em 1848, por ocasião da chamada Primavera dos
Povos, quando, por igual, fracassou a sublevação na região de Malopolska, a
Pequena Polónia. Fugidos, inúmeros patriotas poloneses, retomando a tradição
legada por Tadeusz Kosciuszko, tornaram-se activos internacionalistas, lutando
em outros países europeus contra a política da Santa Aliança: na Itália (Adam
Mickiewicz e Wojciech Chrzanowski), na Alemanha (Wiktor Heltman, Ludwik
Mieroslawski, Franciszek Sznajde), na Áustria (Józef Bem), na França (Maria
Sklodowska-Curie), nos Estados Unidos da América (Helena Modrzejewska e Ignacy
Paderewski) e na Hungria (Józef Bem, Henryk Dembinski, Józef Wysocki).
Em 22 de
Janeiro de 1863, deu-se a última tentativa do século XIX para que eles,
liderados dessa feita por Traugut, recuperassem a sua liberdade. Protestando
contra a convocação militar de jovens para servirem no exército do czar,
milhares de civis rebelaram-se contra o domínio russo. Apesar da simpatia que
arrancaram para a sua causa, novamente ninguém ajudou concretamente os
sublevados (com excepção do líder dos anarquistas russos Mikhail Bakunin que,
em nome do internacionalismo libertário, tentou engajar-se para ir lutar ao
lado dos poloneses; todavia, ficou à distância, em Estocolmo, na Suécia).
Os russos
somente conseguiram liquidar os últimos redutos de resistência em 1865. Os
patriotas foram então deportados em massa para a Sibéria e 18 mil deles
condenados a longas penas de exilados.
O czar
Alexandre II ordenou a dissolução do Reino da Polónia, substituindo-o pelo País
do Vístula, subdividido em 10 regiões transformadas em províncias russas.[11]
Todas essas
insurreições, que demonstravam o carácter indómito do povo polonés, fizeram com
que eles fossem chamados de “os ilotas da
Europa moderna”, pois bastava o opressor distrair-se para ter que enfrentar
um levante.
2.6 A RECUPERAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA E
A QUARTA PARTILHA DA PÓLONIA.
Para alcançar
a tão esperançada liberdade nacional, a Polónia teve que esperar pela desgraça
colectiva dos seus vizinhos, ocorrida ao final da Primeira Guerra Mundial
(1914-1918). Somente com o desmantelamento dos Impérios Centrais (a derrota do
IIº Reich na Alemanha e o fim do domínio dos Habsburgos na Áustria-Hungria,
simultâneo ao colapso da Dinastia Romanov, entre 1917-1920), tornou-se possível
a proclamação de uma república polonesa totalmente autónoma.
Mesmo assim,
os estragos da guerra deixaram suas marcas por todas as partes. A presença dos
exércitos estrangeiros, alemães, austríacos e russos, enfrentando-se por quase
todo o território nacional, deixaram para a nova Polónia uma terra arrasada,
praticamente sem recursos para estruturar o seu tão almejado estado nacional
independente.
A Polónia, que
teve reconhecida sua autonomia pelos bolcheviques, em Março de 1918, entrou em
guerra contra eles em 1920, atendendo à ambição estratégica do Marechal Józef
Pilsudski, herói nacional, em manter o controle sobre os dois mares, o Báltico
e o Negro. O Exército Vermelho reagiu por meio de uma contra-ofensiva e somente
foi batido às portas de Varsóvia, quando Pilsudski lhe impôs uma severa derrota,
conhecida como “O milagre do Vístula”,
que garantiu assim, pela força das armas, a independência nacional.
A Constituição
de 1921, a da chamada Segunda República,
aboliu todos os títulos de nobreza e introduziu o princípio da igualdade cidadã
(todavia, com a ampliação da crise económica internacional desencadeada nos
anos 30 do século XX, a nação viu-se forçada a aprovar a Constituição
autoritária de 1935).
Nos anos
seguintes ao governo do Marechal Pilsudski (a dita “Ditadura Moralizadora”, de 1926 a 1935) dois novos poderes
ameaçadores da segurança da Polónia ergueram-se ao oeste e ao leste. Em 1933, o
nacionalista radical Adolf Hitler assume o poder na Alemanha com explícitos
planos expansionistas (o que implicava o reclamo dos territórios alemães cedidos
à Polónia pelo Tratado de Versalhes, de 1919).
Em 1934, foi a
vez de Staline assegurar definitivamente a sua liderança total sobre o Estado
Soviético, por ocasião do chamado “congresso dos vencedores”, ampliando o
projecto de transformar a URSS numa grande potência. As nuvens negras
carregadas com a tempestade da guerra – formadas pelo nazismo e pelo
estalinismo – ergueram-se sobre os horizontes das duas fronteiras da Polónia.
O país viu-se
vítima da associação entre as duas ditaduras (o Pacto Germano-Soviético de
Agosto de 1939, que estabeleceu a partilha
secreta da Polónia entre Hitler e Staline, ficando o primeiro com ¾ dela)
e, no transcorrer da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), com a Polónia
totalmente ocupada pelo IIIº Reich, ela foi transformada em Governadoria-Geral. Coube
a Hans Frank, um dos piores carrascos nazistas, a sua comandância, servindo de
palco para as batalhas brutais travadas entre os exércitos de Hitler e de
Staline.
Além disso, a
Polónia viu-se escolhida como o local ideal para a aplicação da política de
extermínio em massa (Endlösung)
desencadeada pelas forças de ocupação nazista. Judeus, ciganos e outras
minorias foram transportados em vagões de gado, de todas as partes da Europa,
para serem liquidados nos seus principais campos de morte (Auschwitz-Birkenau,
Treblinka, Sobibor, etc.).
Deu-se,
paralelamente, um planejado massacre da elite polonesa, executado pela Einsatztruppe(tropa de extermínio), que
visou exterminar políticos, intelectuais, académicos, professores, padres,
oficiais superiores, líderes sindicais, etc., fazendo com que a Polónia,
principal cenário da guerra racial nazista, fosse uma das nações que,
proporcionalmente, mais perdesse habitantes civis durante a Segunda Guerra
Mundial[12].
2.7 O LEVANTE DE VARSÓVIA (1944) E
O FIM DAS PARTILHAS.
Batidos os
nazistas em Estalinegrado, em Janeiro de 1943, e novamente derrotados na
batalha do bolsão de Kursk, na Ucrânia, em Julho de 1943, a grande
contra-ofensiva soviética aproximou-se das fronteiras da Polónia em 1944.
Aproveitando-se da evidência do Exército Vermelho estar nas cercanias de
Varsóvia, a resistência polonesa do Armija
Krazowa(AK), braço militar do governo exilado em Londres, lideradas pelo
general Bor-Komarowscki, seguindo nas esteiras do levante judeu do Gueto de
Varsóvia, ocorrido em 1943, intentaram um surpreendente alçamento armado contra
os nazistas. Visavam liberar a cidade e o restante do país sem o auxílio
directo dos russos.
Como os
soviéticos não foram consultados sobre a conveniência da insurreição, iniciada
em 1º de Agosto de 1944, não houve articulação entre o comando polonés na
capital e as tropas russas que estavam do outro lado do rio Vístula, acampadas
a alguns quilómetros distantes. Deu-se, então, a grande tragédia.
Isoladas e mal
equipadas, as milícias do AK, depois de sustentarem um combate urbano
desproporcional durante 63 dias dentro de Varsóvia, foram dizimadas pelas
divisões blindadas da Wehrmachte da SS Dielenburg. Obedecendo à ordem de
Hitler, elas destruíram com canhões, em conjunto com os bombardeios aéreos rasantes
feitos pela Luftwaffe, praticamente
nove décimos da capital polonesa (98% dos edifícios públicos foram
dinamitados). Em meio aos destroços, encontraram-se 200 mil mortos, restos
humanos de um dos mais terríveis massacres da população civil da Segunda Guerra
Mundial.
O levante de
Varsóvia fora mais um dos tantos levantes fracassados da história da Polónia,
só que, desta vez, o desastre de 1944 ultrapassara, em perdas humanas e bens
nacionais destruídos, a qualquer outro episódio do passado nacional dos poloneses.
Somente em Janeiro de 1945, as divisões do Exército Vermelho penetraram na
capital polonesa afastando definitivamente os nazistas. Encontraram uma cidade
destruída, uma enorme metrópole fantasma, estraçalhada por um vagalhão de balas
e de bombas, que haviam feito dela um imenso entulho de tijolos e pedras
calcinadas, misturadas ao sangue derramado dos insurgentes varsovianos.
CONCLUSÃO
Rousseau,
reflectindo sobre o sistema político polonés, escreveu: “Lendo a história do governo da Polónia, compreende-se com dificuldade
como pode, um Estado tão singularmente constituído, subsistir por tão longo
tempo. Um grande corpo formado por um grande número de membros mortos e por um
pequeno número de membros desunidos, cujos movimentos todos, quase
independentes uns dos outros, longe de terem um fim comum, se destroem
mutuamente... que não pode oferecer resistência algum a quem desejar
ofendê-lo...”.[13]
Contudo,
nenhum outro povo da Europa Moderna, de Tadeu Kosciuszco a Lech Walesa, travou
tantas batalhas para, em fim, conseguir aspirar os ares da liberdade, da
autonomia e da independência nacional, como os poloneses o fizeram. Durante bem
mais de dois séculos, esses ilotas do leste empenharam-se em se defender das
intromissões e das ocupações, das violentas repressões, das matanças, seguidas
pelas penas do degredo e do exílio forçado dos patriotas, que as potências
vizinhas os submeteram. E, como se dera no passado, foi o enfraquecimento
delas, da Alemanha (depois da derrota nazista de 1945, seguida da ocupação
aliada) e da Rússia (após o desmantelamento da URSS, em 1989-1991), que
concretamente viabilizou a actual situação democrática que a Polónia voltou a
viver.
Dominada desde
o século XVIII até o XX, a nação sofreu de tudo: da dominação czarista à brutal
ocupação nazista e stalinista. Os poloneses sentiram nas suas costas os
flagelos de todos os tipos de chicote sem que isso afastasse do horizonte deles
a esperança de se verem algum dia verdadeiramente livres.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DAVIES, Norman: God’s
Playground: A History of Poland, New York: Columbia University Press, 1982.
DAVIES, Norman: Heart
of Europe: A Short History of Poland, New York: Oxford University Press,
1984.
HEINE, Marc E: Poland,
New York, Hippocrene Books, 1987.
IWANICKA, Halina:
A Thousand Years of Polish Heritage (Chicago: Commerce Clearing, Inc.,
1966).
KINIEWICZ, Jan: Historia
de Polónia, México, 2001.
KIENIEWICZ, Stefan, e MORAWSKI, Kalikst: La Polonia e il
Risorgimento italiano, Roma, 1961.
KULA, Witold: Teoria
económica do sistema feudal. Lisboa: Editorial Presença, s/d.
MABLY, Abade: De la
législation, ou principe des lois, Amsterdam,
1776.
ROUSSEAU, Jean-Jacques:
Considerações sobre o Governo da Polónia, in Obras Escolhidas. Porto
Alegre: Editora Globo, 1962, vol.II.
TYMOWSKI, Michal: Sinopse de história da Polonia, Editions Spotkania,
Paris, 1986.
[1]ROUSSEAU, Jean-Jacques – Considerações sobre o Governo da
Polónia, in Obras Escolhidas. Porto Alegre: Editora Globo, 1962, vol. II.
[2] A nobreza polonesa dizia ter sua origem nos Sarmatas
(daí Szlachta), uma tribo da qual pouco se conhece, famosa entre os antigos
pelas virtudes cavaleiras. Nesse mito distinguia-se o sentimento da
superioridade oriunda da condição estamental, mas não étnica ou religiosa. O
sarmantismo tornou-se, com o tempo, uma autêntica característica nacional,
obtendo a adesão de todas as classes sociais.
[3] O liberum veto implicava que qualquer integrante da instituição (Dieta
ou assembleia), lançando mão do poder de veto, podia paralisar o poder
executivo.
[4] De
que se destacou Jan Kochanowski (1530-1584) com os seus poemas, cantos, bem
como nos versos fúnebres.
[5]
Particularmente desenvolvida era a astronomia, desse meio surgiu Nicolau
Copérnico (1473-1543), autor de “ Revolutionibus orbium coelestium”.
Desenvolveu-se também a cartografia, agrimensura, medicina, o direito, as
ciências naturais e agrícolas.
[6] Face
à tolerância dominante na Polónia o rei Sigismundo dizia: “ Não quero ser senhor das vossas consciências”. Com isso viu a
existência do luteranismo, calvinismo, catolicismo, russa-ortodoxa, e até as
mais radicais como o arianismo.
[7]
Existia a câmara dos deputados representada pela nobreza, enquanto o antigo
conselho real – denominado senado – era representado pelos magnatas.
[8] Eram
assim chamadas as pessoas que no baixo curso do Dnieper, na região de Zaporoze,
criaram um tipo de República de guerreiros. Os distantes confins da Ucrânia, os
chamados campos selvagens, atraíam os camponeses fugitivos e a nobreza desclassificada.
Eram pessoas valentes, independentes, frequentemente aventureiras e magníficos
soldados. Parte significativa das suas rendas constituía troféus de guerra.
[9] Mosteiro Paulino em
czestochowa e centro nacional do culto mariano (relativo á Virgem Maria).
[10]Este incidente também foi registado por Tolstoi na sua obra “Guerra e
Paz”.
[11] Certamente foram essas circunstâncias sombrias de ver a Polónia
novamente prostrada, lacerada pelas perseguições da polícia czarista, que
inspiraram Henryk Sienkiewicz, célebre romancista histórico, a escrever o
famoso livro Quo Vadis, de 1895, que
se tornou um sucesso mundial, no qual narra os sofrimentos dos cristãos na Roma
antiga, durante o reinado de Nero.
[12]Segundo os dados oficiais do governo polonês,
apresentados em 1947, as perdas resultantes das operações militares chegaram a
521 mil civis. Dentre os quais 3.577 mil vítimas dos campos de concentração e
excussões na liquidação dos guetos; 1.286 mil mortos por epidemias, exaustão,
em prisões e nos campos; 1.681 mil mortos por ferimentos, maus-tratos e
trabalhos forçados fora dos campos; perfazendo um total de 6.544 mil sobre 35
milhões de habitantes existentes na Polónia antes da IIª Guerra Mundial.
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